domingo, 29 de setembro de 2013

"Mitsuko Delivers" (Hara ga kore nande, 2011)


Haverá pior do que estar grávida quase no fim de termo, completamente só, sem tecto sob o qual pernoitar e sem dinheiro no bolso? Assim de repente não me consigo recordar de grande coisa mas Mitsuko (Riisa Naka) parece não se importar. É daquelas miúdas que arregaçam as mangas, mesmo que tenham uma barriga muito grande a dificultar a mobilidade. E decide seguir uma nuvem que a leva à antiga casa de infância. Esta continua a ser habituada pela ex-senhoria Kiyoshi (Miyoko Inagawa) agora acamada, que continua com tão mau feitio quanto antes. Mitsuko passa à acção, impõe-se na antiga casa e aproveita a velha paixão de Yoichi (Aoi Nakamura) para tomar refeições grátis no seu restaurante. Não fosse o facto de estar grávida e seria apenas uma miúda de nariz empinado, meio irritante. Ou se calhar é, mas perdoada pela ternura de uma barriga cheia de vida. “Mitsuko Delivers” tem um título que se pode perder nas várias traduções, mas escusado será dizer que Mitsuko dá à luz a muito mais que uma criança. É quase como se ela tomasse como uma causa sua, provocar desconforto numas vidas acomodadas num falso conforto. Como se ninguém à sua volta estivesse disposto a fazer um esforço extra para melhorar umas vidas que nem são más de todo. Mas porquê, contentar-se com o “bonzinho” quando se pode ter o “muito bom”?

Yuya Ishii é um pensador. Já em “Sawako Decides” (2010), tinha pegado numa personagem feminina forte que provocou uma pequena revolução no seu microcosmos social, com resultados mistos. Ambos os filmes se apresentam como comédias com contornos dramáticos, em tudo semelhantes ao que se faz com regularidade no cinema sul-coreano. Mas algumas piadas podem passar despercebidas ou não ser mesmo do agrado de quem vê. E as personagens principais têm feitios muito peculiares. Se Mitsuko não estivesse grávida, com grande probabilidade perdia a simpatia de grande parte dos espectadores. As personagens são de uma lassidão desconcertante. Tão passivas que uma pessoa se pergunta como é que foram capazes de tomar uma decisão em toda a sua vida. E atenção que estamos a falar da película “Mitsuko Delivers” e não de “Sawako Decides”! A própria imagem não auxilia à resolução dos corações sobre a orientação da película. As tonalidades próximas de sépia não boas indicações de um filme de alma leve e alegre.

O importante em “Mitsuko Delivers” é não olhar sobremaneira para a protagonista mas o modo como a sua acção impacta as vidas dos outros. É filme construído por camadas e, à medida que as exteriores vão sendo retiradas, chegamos a níveis de complexidade tal que finalmente se compreendem os motivos por trás de iniciativas aparentemente aleatórias da protagonista. Em particular, a estória de Jiro (Ryo Ishibashi), o tímido tio de Yoichi e a dona de um restaurante, ameaça roubar o filme. Durante mais de duas décadas e apesar da óbvia química entre os dois, Jiro ainda não foi capaz de abordar o objecto de afeição.
A Mitsuko fez pelas grávidas asiáticas o que a “Juno” fez pelas americanas. As grávidas não têm de ser delicadas, frágeis e hormonais. Sim, Mitsuko é uma espertalhona e não, não é hormonal. É uma força da natureza que chegou para dar um abanão nas vidas dos que a rodeiam. Três estrelas e meia.

Realização: Yuya Ishii
Argumento: Yuya Ishii
Riisa Naka como Mitsuko
Miyoko Inagawa como Miyoko
Aoi Nakamura como Yoichi
Ryo Ishibashi como Jiro

Próximo Filme: "Ghost Child" (Toyol, 2013)

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