domingo, 29 de março de 2015

“MONSTRA a todo o vapor! – Parte 3”


Depois uma segunda parte de festival morna dediquei-me por completo às longas-metragens. Não cheguei a visionar na grande sala “Only Yesterday”, “The Tale of the Princess Kaguya” ou “The Wind Rises” mas extra-festival. Eles valem cada elogio que lhes é feito e uma ou outra crítica também. “The Wind Rises”, lamento, mas não é a obra-prima de Miyazaki e “Only Yesterday” não é um filme para crianças. “The Tale of The Princess Kaguya” mereceu o Grande Prémio do Festival e uma digna última obra do estúdio Ghibli, aparte “Marnie was There” (2014) o qual também aguardo com a ansiedade típica de um fã do trabalho dos mestres.

A 20 de março rumei ao Cinema City Alvalade para mais uma sessão nocturna. Como decisão de último momento, fui assistir a “Giovanni’s Island” sem ter lido mais do que na diagonal a sinopse ou ver o trailer. Não se iria revelar um erro. Um casal idoso num navio em alto mar, cujo marido perscruta com nostalgia a pequena ilha que se aproxima. Trocam dois dedos de conversa e apercebemo-nos da dor na inflexão de voz e nos olhos tristes do homem. Era uma dessas estórias. Voltamos através do tempo e dois irmãos, Junpei (Kota Yokoyama) e Kanta (Junya Taniai) vivem no mundo de fantasia das crianças. Eles são Giovanni e Campanella, os heróis do livro que levam para todo o livro. Seriam os melhores tempos das suas vidas. Em plena II Guerra Mundial, as forças russas invadem a ilha e, como povo derrotado, tudo o que tomavam por garantido é-lhes retirado. Soberania, casa, as suas vidas até. As crianças são apanhadas nos problemas dos adultos mas são elas quem melhor lhes parecem resistir. Na escola, há meninos russos, loiros, altos e que falam uma língua estranha. Eles conseguem o improvável, afeiçoam-se uns aos outros. No entanto, apesar de disparado o último tiro, a paz encontra-se ainda longínqua.

“Giovanni’s Island” é mais uma prova da sensibilidade da animação japonesa para retratar o horror da guerra, constituindo “Grave of the Fireflies” de Isao Takahata o seu expoente máximo. Ambos retratam momentos obscuros da estória japonesa e sobretudo o horror infligido às crianças. Nenhum dos realizadores se escusa a não quebrar o tabu do sofrimento da pequenada. É seguro afirmar que “Giovanni’s Island”, estória fictícia com bases assentes na realidade foi sem dúvida um dos momentos de superioridade narrativa do festival. Quatro estrelas.



Para o último dia de festival ficou a minha última longa-metragem “Jack & the Cuckoo Clock Heart”. No dia mais gélido do ano nasceu em Edimburgo um bebé com um coração gelado, para o salvar Madeleine, uma bruxa parteira conecta o seu coração a um relógio de cuco para o manter vivo. Ela cria Jack como se de um filho se tratasse. Durante alguns anos não há problemas, desde que o petiz respeite três simples regras: não tocar nos ponteiros do relógio, abster-se de emoções fortes e, acima de tudo, não se apaixonar. Um dia e, passados tantos anos, um Jack já adolescente consegue convencer a mãe adoptiva a deixá-lo abandonar o lar protector e visitar a hostil cidade. Confirmam-se os piores receios de Madeleine. Jack conhece a jovem cigana Acácia e é amor à primeira vista. O seu coração entra em desconcerto. Conseguirá ele dominar a mecânica do seu frágil coração para viver e sobreviver ao amor? “Jack & the Cuckoo Clock Heart” é um tema poderoso e, porventura, demasiado adulto para o público juvenil que a ele assistiu. É que este filme é um drama e o final que Mathias Malzieu concebeu não será feliz. “Jack & the Cuckoo Clock Heart” é um derivado do subgénero steampunk e também a sua estória vai buscar elementos da herança cinematográfica universal, incluindo Méliès e a sua “A Trip to the Moon”. No entanto, os seus curtos 94 minutos parecem muito longos, para a perseguição pela Europa de uma amada com problemas de visão. Estes momentos estendem-se com a ajuda de números musicais proporcionados pela banda Dionysos do próprio Malzieu que é inclusivamente referenciada durante o filme. Fiquei na dúvida se a música era um complemento da imagem ou se, pelo contrário, a imagem foi inserida para constituir um videoclip alongado de um álbum da banda de Malzieu.
No campo da imagem nada a apontar. Os personagens assemelham-se a verdadeiros bonecos de criança com expressões humanas o que para alguns é capaz de ser mais arrepiante do que cativante. Infelizmente, a maior crítica a apontar é externa ao filme. Entre legendas em português e inglês houve cenas sem qualquer tradução e ainda momentos de inexactidão. A tradução não correspondia às falas dos personagens. Isto pesou na avaliação do filme pois que, se os próprios adultos não compreendiam na totalidade o que se estava a passar na estória não podem com certeza esperar que fosse a muita criançada presente a tirar sentido de falas em línguas estrangeiras. Três estrelas e meia.
PS: Para o ano há mais.

domingo, 22 de março de 2015

MONSTRA a todo o vapor! - Parte 2


Gosto de pensar que a minha versão da “MONSTRA” foi parca em quantidade mas rica em termos de qualidade. De uma sexta-feira 13 de documentário, saltei para uma segunda-feira de “Pos-eso”, longa-metragem em stop-motion diretamente inspirada de um “The exorcist” e outros inúmeros filmes indissociáveis da evolução da história de cinema de terror (e não só) sem perder um travo caliente. Desde “Evil Dead” a “A trip to the Moon” de Méliès, passando por “The Omen”, nada escapa a Sam, e realizador e escritor com um sentido de humor caustico e, para mal dos pecados católicos, herege. A melhor bailarina de Flamenco do mundo, Trini (Anabel Alonso) tão fogosa na paixão quanto na dança, tem um casamento relâmpago com o melhor toureiro à face da terra. Uma relação que faz correr tinta pelas revistas cor-de-rosa espanholas que auguram o melhor para Damian (Santiago Segura), o filho de ambos. Após a morte do marido num acidente terrível, qual cruel partida do destino Trini entra numa espiral de depressão que a impede de reconhecer que há algo muito errado com o filho. Cabe pois ao padre Lenin (Josema Yuste) que enfrenta uma grave crise de fé salvar Damian do demo. Podia pôr-me a palrar sobre a falta de originalidade e apego demasiado aos filmes que o inspiraram. No entanto, a animação estava fantástica e nenhuma piada caiu no vazio. Não se ouviram grilos. Quando muito, houve espectadores mais atentos que solicitaram a outros que se calassem. As piadas auto-referênciais tendem a ter esse efeito. Sala cheia, ambiente excelente mas não foi filme para Grande Prémio.



De regresso ao Cinema Ideal e, em dia de “The Tale of The Princess Kaguya” no São Jorge, eis que a Sessão “Terror Anim – Amaldiçoados” esteve quase deserta. Com menos de metade da sala preenchida aparentava estarem presentes apenas os fãs do cinema de terror, ainda que em doses residuais. Sessenta e um minutos de sessão não se assemelha a muito, pois não? “Amaldiçoados” é um festival de curtas-metragens de terror que se realiza anualmente no Brasil. A MONSTRA teve a feliz sorte de apresentar 12 curtas entre prémios do júri e do público do festival da edição de 2014. Os resultados foram… mistos. Entre as melhores propostas as curtíssimas “Super Venus”, “The Zombie Survival Guide” que mais parecem uma crítica aos cânones de beleza do séc. XXI e um panfleto animado sobre como sobreviver ao impensável, respectivamente e “The Taxidermist” em que o homem que dava vida àquilo que morreu encontra ele próprio o Fado. “Unhudo” é um caso estranho, baseado numa lenda que terá merecido o voto mais pela proximidade do que pela estória ou animação e quanto menos se disser sobre ele melhor. Uma curta visualmente impressionante mas que me deixou ambivalente foi “The Obvious Child”. É uma curta espantosa, perturbadora, aquilo de que são feitos os pesadelos e difícil de digerir. Então que sentimento é este que me impede de avançar com algo mais do que um “não sei se gostei”? De entre as diversas sessões foi a que me deixou mais insatisfeita, pela diferença óbvia na qualidade entre as propostas, pela baixa qualidade de algumas, porque queria mais… Uma sessão que não ficará para a história. Já nas longas-metragens seguintes, conseguiria encontrar mais motivos para ficar contente. Mas para isso, terão de esperar.

PS: Entretanto fiquem com os vencedores.


sábado, 14 de março de 2015

MONSTRA a todo o vapor!


O certame arrancou dia 12 e, lá estava o Not a Film Critic, na sessão de abertura lotada da Sala Manoel de Oliveira no São Jorge, para fazer a sua cobertura completa e seríssima – not really. Houve mais do mesmo: “este ano vai ser mais melhor bom que o anterior”, momentos musicais de altíssima qualidade (fiquei fã da Mariana Abrunheiro e da Jacqueline Mercado) e algumas personalidades foram convidadas a ir ao palco, incluindo EGEACs, ICAs e realizadores estrangeiros, por entre muitos abraços e beijinhos e o Fernando Galrito (Director Artístico do Festival) falou, falou um pouco mais, falou bastante e por fim, lá se calou, deixando a sensação de que 10 dias são uma gota de água num oceano de cinema animado.

Entre as tantas, demasiadas novidades, destaca-se o separador giríssimo “Rayuela – Jogo da Macaca” criado por Nico Guedes e pela Miss Suzie, dotada de uma brutal energia positiva, que contagiou sala inteira com o som dos seus passinhos rápidos e alegria nervosa. Made in Portugal, pois com certeza. Seguiram-se propostas da América Latina como um “La Gran Carrera” (1935), “Quinoscopio” (1987), “Hasta los Huesos” (2001) e “Llluvia en los Ojos” (2014), pois que este ano, o festival de cinema de animação de Lisboa homenageia a América Latina. Foi uma verdadeira viagem no tempo e pelas diferentes técnicas de animação, que fizeram recordar alguns “Grandes” como o Quino, mais conhecido pela eterna chica-esperta Mafalda; rir de “caixão à cova” ou provocar chuva nos olhos… A retrospectiva dedicada ao Japão quase passaria despercebida, não estivessem uns certos Isao Takahata e Hayao Miyazaki na programação. O único outsider é Mizuho Nishikubo com o seu “Giovanni’s Island (2014), na Competição Oficial de longas-metragens. As propostas remanescentes destes autores são: “The Wind Rises” (2013), “Pom Poko” (1994), “Only Yesterday” (1991), “My Neighours the Yamadas” (1999) e “The Tale of the Princess Kaguya” (2014) e que me levam ao documentário “The Kingdom of Madness and Dream” (2013).

Exibido no Cinema Ideal, na minha estreia nesta sala íntima (é mais bonito do que chamar-lhe pequena), e com lotação quase cheia, tinha as expectativas sem dúvida, por demais, elevadas.

domingo, 8 de março de 2015

"Ghost House" (Gwishini sanda, 2004)


Entramos naquela casa e é amor à primeira-vista. Esquecemos o que penámos, ao procurar em casas excessivamente pequenas, excessivamente caras, distantes da família e do trabalho a que pudéssemos chamar lar. É aquela. Todos os defeitos parecem menores ou de resolução fácil e as paredes falam connosco: “compra-me, compra-me”. Alguns dias depois da mudança ou ainda durante as inevitáveis obras chegamos à conclusão que existe uma infiltração ou a madeira tem bicho. A casa enganou-nos bem.
Pil-gi (Seung-won Cha) tem um problema parecido… mas com um fantasma! Depois de anos de itinerância que lhe tomaram toda a juventude, Pil-gi consegue cumprir a promessa de ser dono da sua própria casa, no leito de morte do pai. Esta é também uma boa notícia para a namorada Soo-kyung (Tae-young Son) que está ansiosa por oficializar a relação e quiçá viver para cuidar do lar de ambos. Quem não fica nada satisfeita com o assunto é Yeon-hwa (Seo-hee Jang) a anterior inquilina que não quer deixar um pormenor insignificante como a morte a impedir de expulsar o novo proprietário. Se a premissa soar a um filme que já viram é porque este existe. “Just Like Heaven” (2005) é a película americana com uma Reese Withersoon mais açucarada que o costume, que junta os elementos ainda mais saudosos de “Il Mare” (2000). O primeiro é uma comédia, o segundo é uma comédia dramática, o terceiro é um dramalhão e vale a pena assistir a qualquer um deles desde que aceitem a sua improbabilidade. Em “Ghost House” a situação insólita é aproveitada para gerar comédia situacional. Yeon-hwa tenta por exemplo, sabotar a organização da nova casa e Pil-gi responde com cerimónias religiosas para tentar expulsar o poltergeist. Todas as tentativas falham de forma miserável. Ele recorre até à ajuda de um psíquico. Fantástico como é sempre tão fácil encontrar alguém com um conhecimento tão… especializado. Além de que, como é habitual neste tipo de filmes, há toda uma série de ataques que geram reacções igualmente agressivas até que por fim, as partes se reúnem para discutir umas tréguas e descobrir que é bem mais o que os une que aquilo que os separa. Mais adiante, surge ainda um interesse pouco escrupuloso que está até acima dos proprietários para que se avance com a construção de um hotel naquele local. Que original.

“Ghost House” funciona num registo muito leve, tanto que poucos minutos após o filme todo o seu conteúdo já se terá evaporado da memória. Seung-won Cha está perfeito no papel de rapaz com bom coração que só quer que as coisas corram bem mas está sempre no lugar errado à hora errada. É, no entanto, perfeito para o fantasma que lhe advém pois é o seu coração de manteiga que irá permitir ao fantasma encontrar algum tipo de resolução. Apesar de um prólogo que demonstra as tribulações de Pil-gi e o pai, uma equipa unida contra o mundo não nos é dada a conhecer a luta de Pil-gi para comprar a casa. De súbito, ele é um homem com uma vida amorosa e trabalho bem-resolvidos. Então por que não haveria de ser dono da sua própria casa? Além disso, teria sido simpático perceber como Pil-gi se apaixonou por aquela casa em particular. Não escolhesse aquela habitação não teria de lidar com fantasmas inconvenientes. Quanto a Seo-hee Jang, ela não lhe fica atrás no que respeita a despertar sentimentos de empatia embora não tenha talvez tanto com que trabalhar, pois a sua presença gira em torno da sua preciosa casa e do amor que lhe está associado. A estória estende-se uns bons vinte minutos mais do que seria desejável. Se os gags funcionam bem na primeira metade do filme, passado o receio do fantasma o desfecho devia ter sido antecipado para evitar o cansaço. Duas estrelas.

O melhor:
- As tentativas da fantasma para expulsar Pil-gi da casa
- As galinhas

O pior:
- Longa Duração
- Os mauzões que querem destruir a casa com o objectivo de ali construir um empreendimento
- Efeitos especiais de qualidade duvidosa

Realização: Sang-jin Kim
Argumento: Hang-jun Jang e Jae-yeong Jang
Seung-won Cha como Pil-gi
Seo-hee Jang como Yeon-hwa
Hang-Seon Jang como Jang Kil-bog
Tae-yeong Son como Soo-kyung
Moo-sik Yun como pai de Pil-gi

Próximo Filme: "Lost on Journey" (Ren zai jiong tu, 2010)

segunda-feira, 2 de março de 2015

Top 15: Música de Filmes de Terror



O terror é muito provavelmente um dos géneros onde é mais importante assegurar que a música e o som são irrepreensíveis. Se existir um desfasamento entre a selecção musical e os acontecimentos que se desenrolam no écrã, o efeito de assustar não sortirá efeito. Injustiçado, nas nomeações para prémios de cinema multigénero, ridicularizado e até inferiorizado pelos pares, é nos aspectos técnicos que as “academias” e júris por esse mundo fora são mais generosos com o género, atribuindo-lhe normalmente os prémios de consolação que lhe escapam nas categorias principais. Podia transformar este top num espancamento público dos tipos que só nomeiam os filmes de terror para as categorias que "não interessam a ninguém", se é que são nomeados de todo, mas não tenho tempo nem energia. Conto convosco para isso. Entretanto, faço notar que não adquiri do dia para a noite e, por artes mágicas, a capacidade de compreender boa música. Segui apenas três critérios: gosto pessoal, originalidade e a sua implantação na memória colectiva. Por isso, se alguém me tentar explicar por que o número um é vastamente superior ao número três o mais provável é esboçar um sorriso, responder: “Sim senhor. Tens toda a razão” e ignorar.

1. “Psycho” (Bernard Herrmann, 1960) – Nada como apostar numa das composições mais consensuais e reconhecíveis de que há memória. Quantos de vocês, quando ouvem esta música não começam a gesticular feitos loucos, recriando o movimento de esfaquear alguém?! Não? Ok. Essa é a popular e tantas vezes parodiada cena da morte de Marion Crane (Janet Leigh), até àquele momento considerada a protagonista de “Psycho”. Se a morte por si só é considerada chocante (mataram a Marion?!), o efeito é exacerbado pela música inquietante mas subtil que a antecede e não fazia prever tal evento. A audiência tinha-se afeiçoado à personagem pelo que seria de esperar que esta a ser retirada de cena, o fosse com elegância e suavidade. Nada podia estar mais longe da verdade. Os violinos tornam-se golpes afiados, rápidos e furiosos e Marion tem uma morte bárbara, angustiante. Se Hitchcock nos fez afeiçoar à protagonista, Herrmann retirou-a de cena com ferocidade.

2. “Rosemary's Baby” (Krzysztof Komeda, 1968) – Em termos de construção, a música parece pouco complexa. O instrumental parece datado e apenas sobressai o canto de Rosemary. Mas haverá momento mais ternurento do que aquele em que uma mãe embala o seu bebé? É pouco importante que ela tenha um tom bonito ou sequer angelical. O factor de atracção é antes a inocência, ingenuidade até, quanto ao ser que carrega. Um momento que seria de extrema felicidade torna-se pois o exacto oposto e marca o tom dramático da estória pois a música brinca com o receio de todos os pais de que o seu filho possa não ser “perfeito”.

3. “The Exorcist” (Mike Oldfield, 1973) – “Tubular Bells” está para “The Exorcist” como “Lux Aeterna” está para “Requiem for a Dream”, sendo que curiosamente, a actriz Ellen Burstyn contracena em ambos. Qualquer das músicas é fenomenal por si própria e qualquer uma delas é reconhecível como “a música daquele filme que posso não me lembrar de imediato qual é, mas tenho a certeza que é do cinema”. No caso de “The Exorcist” apesar de parecer feito à medida, “Tubular Bells” do já editado álbum de Mike Oldfield foi apenas um dos temas que encontraram para colmatar a ausência de música. Ela é nota dissonante numa película onde a orquestra predomina. Tal como é nota dissonante, a menina-criança que irrompe num comportamento destructivo, nada característico do que seria expectável de uma pessoa com aquela idade e muito menos de um ser humano.

4. “Jaws” (John Williams, 1975) – Uma rapariga desnuda decide nadar à tardinha. Daí a pouco ela é sacudida como se de uma boneca de trapos se tratasse. Não vemos mais do que indícios do que a possa ter atacado abaixo da linha de água. Também não precisamos. Como é que se faz uma pessoa ter medo de estar dentro de água? Trauteia-se “Duuun dun duuun dun dun”. Se o som é erradamente considerado minimalista, o efeito é supremo. Contam os (mais) adultos que no verão após estrear “Jaws” as praias estavam vazias. O medo da água e do que está lá debaixo era tão grande que houve até quem tivesse medo de se sentar na sanita. Ora, como é que alguém acha que um tubarão seria capaz de chegar a uma sanita, quanto mais morder-lhe o traseiro naquele momento tão delicado, escapa-me. Mas e daí, o medo não é racional. É este o legado de “Jaws”.

5. “Suspiria” (Goblin, 1977) – Não sei o que dará um mix de sonhos, drogas, nostalgia, terror, idade média, rock e indiferença com o que outros poderão pensar, mas imagino que seja algo parecido com a banda-sonora de “Suspiria”. A produção da banda italiana Goblin é reconhecível, sem ser uma produção barata e representa ainda aquilo que muitos compositores de filmes de terror gostariam de ser: livres. Se existe a sensação que um filme de terror está limitado na selecção de música e, a maioria das películas divide-se entre a orquestra ou o rock/pop com algumas escolhas dúbias, “Suspiria” demonstra que é possível juntar um sintetizador e murmúrios muito rock sem perder impacto ou se ser rotulado de zombaria.


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