sexta-feira, 24 de junho de 2011

"The Maid", 2005

Já era tempo de nos chegar uma surpresa agradável de Singapura. O problema é ser também a primeira, que não há termo de comparação. Ainda assim fiquei bem impressionada. "The Maid" representa uma realidade bem mais negra que a ficção. Quantas vezes não se ouve falar de casos de jovens que são atraídas para outros países para trabalhar e acabam nas malhas da escravidão, prostituição e de tráfico de órgãos? Calma, que a película é inspirada no real mas prefere a rota do sobrenatural. Ora, "The Maid", pega precisamente na prática recorrente da contratação de jovens pobres para irem trabalhar como empregadas fora dos seus países de origem. Kelvin Tong mostra, desde logo, a banalidade do processo e da mercantilização de vidas humanas num álbum de fotografias de potenciais candidatas. Beleza, idade, postura corporal, peso... Selecção de gado? Rosa Dimaano (Alessandra de Rossi), de 18 anos é a jovem seleccionada que troca pela primeira vez a tranquilidade da sua localidade rural nas Filipinas pelos edifícios altos e trânsito ruidoso de Singapura. A sua reacção inicial é de fascínio, o que não é para menos, dado o meio de onde veio. Nas suas palavras, aquela é a sua oportunidade de conhecer o mundo. E bem diferente é o mundo em que vai entrar. Rosa será a empregada de um supersticioso casal chinês o que contrasta, profundamente, com a sua crença católica. Para mais, ela chega no primeiro dia do sétimo mês chinês, aquele em que (segundo se diz), os portões do inferno se abrem e os espíritos andam à solta para se vingar das ofensas cometidas contra eles em vida. À sua volta, todos parecem levar muito a sério esta mitologia e fazem oferendas para apaziguar os espíritos e mantê-los longe dos seus lares. Entretanto, Rosa fica a conhecer Ah Soon, o filho do casal, um homem com mente de criança que desde logo se afeiçoa à nova criadita.
"The Maid" é um pouco de "The Sixth Sense" (1999), e de filmes baseados em velhas superstições populares em partes iguais. Assim, dos mais recentes posso nomear o "Tali Pocong Perawan" (2008) da Indonésia e o "Sick Nurses" (2007), da Tailândia. Mas arranja força e originalidade pelo seu próprio mérito. A cinematografia é belíssima: as cores vibrantes das comemorações do sétimo mês chinês e o seu contraste com as cores frias da vida quotidiana de Singapura estão algo de especial. E o melhor é que vemos e sabemos tanto quanto Rosa pois o mundo dos mitos e ritos chineses é novidade para ela! Tanto que Rosa, logo à chegada, comete sem intenção uma grave ofensa aos espíritos, quando pisa a oferenda que o casal chinês tão encarecidamente lhes tinha feito. Rosa atrai sobre si azar e começa a ver coisas que não deveriam estar... O resto é história.
Kelvin Tong, volta a brindar-nos com algumas surpresas. O pormenor da narrativa de Rosa, o olharmos pelos seus próprios olhos inocentes é um toque brilhante. E o modo como esta se transforma mais para o final está um modo original de contar uma história sobre outra perspectiva. Como não podia deixar de ser, o elemento sobrenatural está muito presente e fornece alguns sustos eficazes. Houve alturas em que pulei da cadeira com Rosa e pensei: "eu teria sentido o mesmo". Numa reflexão final e porque tantos filmes insistem nos perigos do oculto, por vezes, urge questionarmos se o mal estará mesmo naquilo que desconhecemos ou no comportamento humano, que pode ser tão imprevisível e perigoso. No meio de tanta coisa igual, Kelvin Tong arrisca e apresenta-nos um final inesperado. Quatro estrelas em cinco.



Realização: Kelvin Tong
Argumento: Kelvin Tong
Elenco:
Alessanda de Rossi como Rosa Dimaano
Huifang Hong como Senhora Teo
Chen Shu Cheng como Senhor Teo
Benny Soh como Ah Soon
Zhenwei Guan como Wati

Próximo Filme: "Blood Rain" (Hyeol-ui nu, 2005)

2 comentários:

  1. Meu amigo, você posta filmes realmente raros, de um universo que desconheço, para falar a verdade. Mas seu trabalho está de parabéns. Vou continuar cavocando e voltarei mais vezes, certamente.
    Um abraço.

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  2. Olá Raros! Eu ponho aqui sobretudo mas não só filmes do sudeste asiático. Gosto de dar a conhecer esse tipo de filmes que são menos conhecidos. Obrigada, mas você é que encontra verdadeiras pérolas ou não fosse o seu site Raros da Web ;)

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