domingo, 31 de agosto de 2014

"The Raid 2: Berandal", 2014


Em 2011 dava-se um dos primeiros momentos "Unicórnio Cor-de-rosa", entenda-se "todos sabem que não existe mas todos esperam secretamente que exista" e estreava "The Raid: Redemption". O melhor de filme de acção da última década disseram alguns, quiçá de sempre, disseram outros. Apresentava uma arte marcial inédita (silat) e adrenalina como há muito não se via. A sinopse era algo tão simples como: uma equipa SWAT que entra num edifício em Jacarta para combater o domínio de um barão da droga acaba encurralada e massacrada pelos mesmos que jurou destruir. Em 2014, surge "The Raid 2: Berandal" e volta a dar-se o fenómeno "Unicórnio Cor-de-rosa", daqueles que só se repetem uma vez em cada ciclo cinematográfico: a sequela ser superior ao filme que a antecede. Se não sentem o mesmo, lamento mas estão em negação que, bem dentro dos vossos corações, sabem que o que estou a dizer é verdade.

Rama (Iko Uwais) o polícia sobrevivente ao massacre do primeiro filme (e, também ele responsável por um) faz um pacto com os superiores: deverá assumir uma nova identidade e infiltrar-se no seio do crime organizado, de modo a chegar ao topo da cadeia e arranjar provas comprometedoras contra os grandes chefes. A alternativa não se avizinha a melhor: se recusar e regressar à família será perseguido pelos criminosos e colocará em perigo a vida de todos. Assim, Rama segue numa odisseia pelo crime que inclui ser preso para se tornar próximo de Uco (Arifin Putra) filho de Bangun (Tio Pakusodewo), um dos pais do crime de Jacarta. O resto é estória e sequências infindáveis de pancada não aconselháveis aos mais sensíveis. Isto, como quem diz, se forem sensíveis e, "The Raid 2: Berandal" não é, em definitivo, para os de estômago fraco fizeram a pior selecção de filme possível. Mas se forem, como eu, entusiastas de bom cinema de acção e de artes marciais sentem-se e apreciem a Mona Lisa do realizador Gareth Evans.
Uma das grandes victórias deste filme improvável é o facto de ser impossível apreciá-lo em silêncio absoluto. Os combates são a cereja no topo do bolo e Gareth, a esse nível, não nos poupou. Há mais e muito bons vilões incluindo o irascível e mimado Uco, a misteriosa “Hammer Girl”, Alicia (Julie Estelle) e o assassino por encomenda Prakoso (Yayan Ruhian). Estas cenas exigem uma tal fisicalidade dos actores e dos duplos que darão por vós a soltar muitos “ahs”,“uis” e até arfar com a falta de fôlego, para o ecrã, tornando a película interactiva de um modo positivamente inesperado. Mais, a audiência não é poupada ao cinema mais visceral: cada golpe é sentido e o sangue não é ocultado. Os actores, para o final parecem sombras de si próprios, como se tivessem sido espancados, física e psicologicamente. Não me tomem por sádica mas sabemos que estamos a assistir a algo especial quando os actores fingem tão complemente que a dor que ostentam parece real. Tais sequências de pancadaria selvática exibem uma graciosidade tal que se assemelham a um bailado. A coreografia é novamente dirigida pelo multifacetado Yayan Ruhian que não só regressa a este papel como volta a interpretar um papel sem qualquer ligação com o do filme anterior, demonstrando mais carisma que muitos actores veteranos. Pelo trabalho técnico, “The Raid 2: Berandal” merece o maior destaque e ser premiado; pela inovação, vagas sucessivas de audiências sem medo de experienciar o verdade cinema de acção. Coloquem de parte o preconceito por “ser um filme de artes marciais”. “The Raid 2: Berandal” é um bom filme e é apenas isso que necessitam saber. E é um filme tão imponente que é capaz de fazer homens adultos questionar a sua masculinidade e por empatia, fazer crescer pêlos no peito às mulheres. Ok, estou a exagerar mas acho que percebem a ideia.
“The Raid 2: Berandal” não está isento de falhas. Além de cenas que desafiam as leis da física, é incrível como certos personagens, com tal desgaste físico se aguentam ainda de pé. Pessoal, não tentem isto em casa, mas estou certa que se levarem um murro bem dado, não sei, digo eu, que perdem os sentidos. Quanto mais levar uma dezena e na cena a seguir estarem frescos como um pêssego. No entanto, onde é competente, é-o de tal modo que os defeitos, reais ou percepcionados quase desaparecem do nosso radar. Quatro estrelas.

O melhor:
- As sequências de combate, nomeadamente, a luta na lama (sem bikinis)
- O retorno de Yayan Ruhian
- Silat.

O pior:
- Improbabilidade de algumas cenas.
-  A estória deixa de fazer sentido para se tornar apenas uma desculpa para inúmeras sequências de confronto.

Realização: Gareth Evans
Argumento: Gareth Evans
Iko Uwais como Rama
Arifin Putra como Uco
Tio Pakusodewo como Bangun
Oka Antara como Eka
Alex Abbad como Bejo
Cecep Arif Rahman como “Assassino”
Julie Estelle como Alicia
Very Tri Yulisman como “Homem do bastão”
Ryuhei Matsuda como Keichi
Kenichi Endo como Goto
Yayan Ruhian como Prakoso

Próximo Filme: "71 into the Fire" (Pohwasogeuro, 2010)

PS: Este filme vai ser exibido no Motelx, dias 10 de setembro pelas 16h00 e 14, às 00h15. Não sejam uns meninos e apareçam!

domingo, 3 de agosto de 2014

Ragnarok (Gaten Ragnarok, 2013)


Há quanto tempo não assistem a um filme de aventura? Ou melhor, qual foi o último verdadeiro filme de aventura a que assistiram que não envolva robots ou heróis da Marvel e que não seja uma sequela? Foi o que me pareceu.

“Gaten Ragnarok” inicia-se com uma obsessão. Sigurd Svendsen (Pål Sverre Hagen) é um arqueólogo trintão e pai de dois filhos que vive para o trabalho. Desde a morte da mulher (a quantidade de viúvos desgraçados por esse cinema fora), que Sigurd descura a vida a pessoal e busca, de modo compulsivo, uma grande descoberta relacionada com um antigo navio viking. Na sua mente perturbada pela dor, Sigurd crê que a falecida mulher ficaria feliz por ele. Acho que criar os filhos para se tornarem jovens adultos saudáveis faria mais pela felicidade de todos os que ainda vivem mas isso sou eu que sou esquisita. Na verdade Sigurd não está a fazer grande coisa nem pelos filhos nem pela carreira, pois mais não faz senão andar em círculos. Para o director do museu (Terje Strømdahl) onde trabalha é a gota de água, depois de mais um discurso fantasioso de Sigurd perante potenciais patrocinadores que provoca o corte de uma vital bolsa de investigação. Ele experimentou dizer-lhe que seguisse outra linha de trabalho, aconselhou até que acompanhasse mais os filhos e nada. Tudo parece perdido para Sigurd quando desilude a pequena Ragnhild (Maria Annette Tanderød Berglyd) pela enésima vez e vê, perante si, a possibilidade de anos a fio sem aventura, limitado ao papel de mero guia dos visitantes do museu. Quantos não desejariam um simples trabalho de escritório pago? É o colega Allan (Nicolai Cleve Broch) quem vem abalar a realidade monótona que decerto se abateria sobre o homem ainda novo e inconformado. Uma antiga pedra, com runas milenares revela informação fulcral sobre um dos momentos mais obscuros e interessantes da mitologia nórdica, o “Ragnarok”, ou a série de ocorrências que levarão ao fim do mundo como este é conhecido na actualidade. Determinados e empurrados pela informação recém-descoberta Sigurd e Allan partem com as crianças para Finnmark, a região de beleza inóspita mais ao norte da Noruega que faz fronteira com a Rússia. Lá reúnem-se a Elisabeth (Sofia Helin) uma exploradora experiente e a Leif (Bjørn Sundquist) um guia com mau feitio, para encontrar mais artefactos arqueológicos, vestígios da era soviética e algo de que ninguém estava à espera (se não tiverem visto mais do que o 1.º trailer, claro).

Sabem aquele ditado que diz qualquer coisa como não ser o destino que conta mas a viagem que se faz para lá chegar? Não é isto. As paisagens são magníficas e atravessar terras que poucos pisaram tem algo de excitante mas é Sigurd é um completo idiota. Trouxe os filhos a reboque apenas por obrigação e pouco mais que a atenção de Elisabeth o atrai quando não está à procura de pistas para o “maior achado arqueológico nórdico de sempre”.  Está completamente cego quanto ao que tem à sua frente. Por isso, quando finalmente se apercebe do seu erro pode ser tarde demais para salvar os filhos e o novo interesse amoroso.
Esta entrada oriunda da gelada Noruega encontra na sua própria terra e na mitologia escandinava os ingredientes certos para um filme de aventura. Os planos gerais de fiordes noruegueses e montanhas virgens parecem gritar por um grupo de intrépidos exploradores e evoca personagens como Indiana Jones ou James Bond cujo encanto ia além da sua própria persona. A audiência queria saber de que estes personagens eram capazes quando eram inseridos, por vezes inadvertidamente, em ambientes que não eram o seu e se conseguiam testar-se até ao fim das suas forças. Se a “Gaten Ragnarok” falta algo presente nestas narrativas é “O” personagem. Sigurd não inspira simpatia, ainda que a sua demanda desponte a curiosidade, Allan não deixa de ser um sidekick, mas até ele tem os seus defeitos e Elisabeth que se demonstra forte e corajosa, uma mulher alfa, se quiserem, não surge no ecrã tempo suficiente para roubar o estrelato. Mas os problemas não se quedam por aí. O ângulo da mitologia ou da presença soviética tal como o julgávamos, perde-se demasiado rápido e dá lugar a efeitos gerados por computador que deixam muito a desejar. As cartadas do argumento são depois, por demais previsíveis e inofensivas, (digamos que os maus têm o que merecem) deixando até abertura para uma sequela. Mas num deserto de filmes de aventura sem o predicado da originalidade, “Gaten Ragnarok” torna-se quase um “mal” necessário. Pode não ser o filme de aventura que queremos mas o filme de aventura que precisamos. Para ver com os miúdos. Duas estrelas e meia.

O melhor:
- Filme para ver em família
- Factor aventura
- Produto light, refrescante e inofensivo

O pior:
- Efeitos especiais fraquinhos, fraquinhos...
- Sigurd e Allan são capazes de ser os piores arqueólogos de sempre
- Sigurd também não é exactamente o pai do ano
- Necessitava de mais uns minutos de acção.

Realização: Mikkel Brænne Sandemose
Argumento: John Kåre Raake
Pål Sverre Hagen como Sigurd Svendsen
Nicolai Cleve Broch como Allan
Bjørn Sundquist como Leif
Sofia Helin como Elisabeth
Maria Annette Tanderød Berglyd como Ragnhild
Julian Podolski como Brage
Terje Strømdahl como Director do Museu



Próximo Filme: "The Raid 2: Berandal", 2014