terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

"The Tag Along" (Hong yi xiao nu hai, 2015)

Trailer cheio de spoilers. Ver por vossa conta e risco.

Um sucesso estrondoso, na sua nativa Taiwan, “The Tag Along” baseia-se numa história afamada, de final dos anos 90, que se tornou um mito urbano. Segundo reza a história, uma família, assistiu após o funeral de um familiar, a um vídeo no qual viu uma menina de vermelho a seguir o falecido quando este integrava um grupo de caminhantes em passeio por uma montanha. Daí até aos avistamentos se multiplicarem foi um instante, sendo um dos visionamentos mais recentes, se deu quando uma idosa se perdeu numa montanha, tendo sido encontrada cinco dias depois com vida, a contar uma estória delirante sobre uma menina vestida de vermelho.

Em “The Tag Along”, acompanhamos o dia-a-dia de Wei (River Huang) é um agene imobiliário que trabalha duramente para poder casar e constituir família com Yi-chun (Wei-Ning Hsu). Eles são um casal há vários anos, mas chegaram a um ponto crítico da relação. Wei deseja ter uma família tradicional, enquanto Yi-chun parece estar contente com a relação e que esta se mantenha nos termos habituais. Nem o casamento nem a maternidade fazem parte dos seus planos e Shu-Fang (Yin-Shang Liu), a avó de Wei também é fonte de discórdia. Acolher a familiar do namorado seráum obstáculo ao desejo de estilo de vida independente que Yi-chun almeja. O delicado balanço destas relações é colocado em causa quando a avó de Wei desaparece, num paralelismo demasiado evidente com uma lenda local.

“The Tag Along” é um exercício interessante de contenção no retrato da vida “real” dos personagens e de fogo-de-artifício no que respeita à suposta assombração. É-nos permitido perscrutar um pouco mais do que uma espreitadela sobre a vida dos personagens, através da repetição. A avó de Wei de fazer todo o tipo de tarefas que permitam um maior grau de conforto ao neto. Ela acorda-o e prepara-lhe o pequeno-almoço e preocupa-se com ele pois só o quer ver feliz. Sabe que parte da felicidade está em constituir família com Yi-chun. Tenta para isso, provocar oportunidades para os juntar a despeito as reticências desta. Wei tem um horário vai além do que lhe é pedido para conseguir reunir condições para realizar o seu ideário de vida perfeita. Yi-chun é DJ numa rádio e encontra-se com o namorado no final dos turnos que acabou de fazer. Nada de muito excitante para uma classe média tradicional. Estes pedaços de vida são interessantes o para compreender os personagens e criar um elo emocional suficientemente forte para sentirmos a sua falta, quando o meio sobrenatural se introduz nas suas vidas. O elo mais fraco do trio já mencionado ainda assim é capaz de ser o actor River Huang. Wei-Ning Hsu interpreta uma avó capaz de captar a simpatia das avozinhas por esse mundo fora. Já Yin-Shang Liu representa a força vital do filme com um desempenho com camadas suficientes para demonstrar que a sua personagem pode ser mulher forte, independente, feminista e ter os receios de quem já sofreu no passado. A sua personagem perde-se depois no primitivismo do status quo societal tão certo quanto dois mais dois darem a soma de quatro. Sempre, muito bem coadjuvados com uma cinematografia eficaz e incomum entre os seus congéneres. Mas falava de repetições: quando a assombração assola existem variações suficientes no comportamento padrão dos personagens para perceber que algo está errado.

O mal de “The Tag Along” está em que o prelúdio para algo maior é a melhor parte do filme. O primeiro acto que corresponde ao desaparecimento e o segundo que diz respeito à investigação são mais interessantes que o último acto de conflito aberto. A película degenera num melodrama sacarino e efeitos gerados por computador de bradar aos céus. Alguém acha sinceramente que o “Alien” teria metade do encanto se têm mostrado o monstro num CGI manhoso? Porquê é a palavra operativa. Não havia necessidade de abalar o que até ali fora construído, em atmosfera opressiva e mistério de investigação, com efeitos "especiais" para agradar a ensejos de blockbuster. “The Tag Along” tentou, em contraciclo com o recente terror asiático, ser vagamente interessante e, em certa medida, conseguiu.
Realização: Wei-Hao Cheng
Argumento: Shih-Keng Chien
Wei-Ning Hsu como Shen Yi-Chun
River Huang como Ho Chih-Wei
Yin-Shang Liu como Ho Wen Shu-Fang
Po-Chou Chang como Tio Kun
Ming-Hua Pai como Tia Shui

Próximo Filme: "Tale of Tales" (Il racconto dei racconti, 2015)

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

"Exte - Hair Extensions" (Ekusute, 2007)

Trailer dobrado em inglês

Dois guardas portuários japoneses encontram o cadáver de uma jovem estrangeira com o cabelo rapado, num contentor cheio de cabelos humanos destinados à indústria de beleza. Na morgue, a polícia apercebe-se que está perante um caso de tráfico humano, dado que foi feita uma colheita de órgãos da vítima antes da sua morte. Yamazaki (Ren Osugi), um sinistro funcionário da morgue com um fetiche por cabelo, fica fascinado com o mais recente cadáver. Os cabelos da vítima continuam a nascer e brotam das feridas e de outros orifícios do corpo da jovem assassinada! Isto, constitui uma oportunidade para o tricófilo Yamazaki renovar incessantemente o stock de cabelos para satisfazer as suas perversões e de fazer negócio através da venda de extensões para os seus contactos em cabeleireiros. Pelo seu caminho cruza-se Yuko (Chiaki Kuriyama), uma aprendiza no cabeleireiro Gilles de Rais, a quem é imposta a presença da sobrinha Mami (Miku Sato), uma menina que exibe sintomas de abuso, mesmo antes de uma demonstração importante no sítio onde trabalha. A ligação ao cabeleireiro representa amplas oportunidades para os personagens que surgirem no caminho dos cabelos da estrangeira serem afectados pela sua maldição mortal, ainda que a contagem de mortes seja diminuta.

Como já foi tantas vezes retratado no cinema japonês, sendo “Ju-on: The Grudge” (2002), um dos seus expoentes máximos, o rancor de uma morte violenta pode apegar-se a objectos, amaldiçoando-os. Onde entrar na casa desse filme era sinónimo de uma morte breve e violenta, em “Exte” a ira da vítima foi transferida para os cabelos rapados da estrangeira para venda como extensões. Se a vítima não os pode ter, quaisquer outros que os coloquem nos seus escalpes também não!
“Exte: Hair Extensions” é um filme muito desigual. A cena inicial que ocorre durante a noite, na qual é descoberto um corpo mutilado, contrasta por completo com a manhã solarenga e animada que se lhe segue. Após um tom de terror prometedor, eis que os personagens vão debitando informação sobre quem são, as suas motivações e ocupações. A justificação apresentada – também pelas personagens –, para comportamento tão estranho é a imitação de um programa de televisão onde os actores efetuam diálogos expositórios, de forma bastante cómica. Se esses pequenos laivos de comédia são interessantes, também se revelam uma maneira preguiçosa de os argumentistas colocarem toda a informação ao dispôr da audiência, sem se preocupar com coisas tão mesquinhas quanto os comportamentos revelarem, a personalidade das personagens.

Sion Sono é um dos nomes mais bem conhecidos e divisivos do cinema japonês, tendo no currículo obras como “Suicide Club” (2001), “Noriko’s Dinner Table (2005) ou “Love Exposure” (2008) para citar apenas alguns. Diria que desta feita se embrenha totalmente no mundo do J-horror mas, a verdade é que os filmes de Sono têm sempre algo de perturbador pelo que os elementos de horror estão sempre presentes. Note-se por exemplo, o pormenor de o cabeleireiro onde Yuko trabalha se chamar Gilles de Rais. O nome francês pode dar uma aparência chique ao salão  mas o nome escolhido corresponde ao de um nobre dos tempos medievais mais conhecido como um assassino em série de crianças. Na mesma linha, existe uma relação tensa e abusiva entre Kiyomi (Tsugumi) e Mami (Miku Sato), a irmã e a sobrinha de Yuko respetivamente. Também existe a sugestão implícita de Kiyomi também maltratava Yuko, maus-tratos que se estendem agora à filha e que porventura, Yuko terá tentado afastar-se da irmã por causa disso. Kiyomi é um monstro, mas não é imediatamente compreensível como é suposto este monstro "real", se encaixa na estória se não para dizer que enquanto Kiyomi tem uma personalidade horrível porque assim o deseja, a desconhecida assim ficou por conta do mal que lhe fizeram. Por seu turno, Yamazaki é um terceiro monstro, não pelo seu fetiche, mas por o colocar acima de tudo, mesmo quando percebe que os cabelos estão na base de mortes horríveis. “Exte: Hair Extensions” perde-se nos muitos hair movies que existem e na própria cabeça de um Sono que não consegue decidir-se por uma narrativa. Vale pelos parcos e inventivos momentos de terror.


Realização: Sion Sono
Argumento: Sion Sono, Masaki Adachi e Makoto Sanada
Chiaki Kuriyama como Yuko Mizushima
Ren Osugi como Gunji Yamazaki
Megumi Sato como Yuki Morita
Tsugumi como Kiyomi Mizushima
Eri Machimoto como Sachi Kondo
Miku Sato como Mami Mizushima
Mayu Sakuma como rapariga estrangeira

PS: Gente gira se quiserem adquirir o DVD deste hair movie clássico ou se tiverem apenas um fetiche com a Chiaki Kuriyama, ebay is your friend.

Próximo Filme: "The Tag Along" (Hong yi xiao nu hai, 2015)