domingo, 18 de março de 2012

Cineuphórica pela animação!


Passado dia 14 de Março, tive oportunidade de assistir à cerimónia de entrega dos prémios Cineuphoria, destinados a reconhecer a produção cinematográfica estreada no ano anterior em Portugal quer em salas de cinema, televisão, internet ou festivais de cinema, e devidamente publicados no CinEuphoria (…)
A iniciativa, organizada em colaboração com o Portugal Fantástico foi uma celebração da produção nacional com a exibição de curtas-metragens portuguesas: “Bats in the Belfry”, “Conto do Vento”, “A Cova”, “Faminto”, “O Vôo da Papoila”, “S.C.U.M” e “Shadows”.
Foi uma excelente oportunidade de conhecer a ficção nacional e foi curioso notar como a maioria das curtas apostaram em estórias fantásticas e/ou de acção. Mas foram as curtas de animação que roubaram o espectáculo.


“Bats in the Belfry” (2010)

“Bats in the Belfry” é uma curiosa expressão inglesa que significa alguém que é um pouco tonto ou não está bom da cabeça. Bats são morcegos e belfry é o campanário. Por isso, se alguém tem morceguinhos no campanário é porque não bate bem da cuca, coitado. Ricos morceguinhos teve o João Alves que fez tudo o que era humanamente possível nesta curta-metragem: realização, produção, argumento, voz, música e montagem.

Bats in the Belfry  narra a história de Deadeye Jack que após uma frustrada  tentativa de assalto durante o dia, tenta retomá-lo usando a noite como cobertura mas ao surpreender os donos do dinheiro, Jack interrompe uma refeição da qual se arrisca a tornar-se o prato principal.

Deadeye Jack é o tipo loner dos westerns spaghetti que só quer estar na dele. Dar um golpe de vez em quando para o gastar em bebida e mulheres. Cada um com os seus vícios e ele não deve nada a ninguém. No fundo, é um tipo simples que só quer ser deixado em paz. Apenas não tem nada de deadeye, quando saca da pistola é mortal. Até que durante um golpe se depara com vampiros. Sim, vampiros no velho faroeste. Depois de alienígenas em westerns e zombies no século XXI, não é como se fosse um absurdo. “Bats in the Belfry” tem reunido entretanto, uma série de prémios incluindo o de melhor curta de terror portuguesa no MOTELx 2010, melhor animação de 2010 do Shortcutz Lisboa e o melhor jovem realizador de 2011 do Fantasporto. Até faz parte da selecção oficial do "A Night of Horror International Film Festival" na Austrália, quase nos antípodas de Portugal! A geração dos anos 90 que cresceu com “Samurai Jack” e Dexter’s Lab” encontrará nestas as séries as referências essenciais para esta obra de João Alves. Um docinho para os mais saudosos, uma curiosidade para os novos fãs. "Bats in the Belfry” é uma obra inteligente, que junta comédia e terror aproveitando a obsessão actual com tudo o que é fantástico: mortos-vivos, vampiros, monstros... A ver!

Realização: João Alves
Argumento: João Alves
João Alves como Deadeye Jack (voz)
Rita Soares como Mulher (voz)


“Conto do Vento” (2010)

Desde que estreou no Festival Avanca 2010, nunca mais parou. Bóreas acolheu o “Conto do Vento” nos seus braços de titã e levou-o, com o vento, por esse mundo fora, colhendo prémios. Na Grécia, recebeu o  Prémio Animação do Naoussa International Film Festival 2011, na Albânia, recebeu a distinção de "Melhor Filme de Animação" do Festival Internacional de Cinema de Tirana e no Brasil, foi eleito o melhor filme da Mostra Ibero-Americana do Festival Visões Periféricas e continua a arrecadá-los por onde passa.

É uma fábula sobre uma menina e a sua mãe numa sociedade preconceituosa, algures no interior norte de uma aldeia portuguesa.

“Conto do Vento” é uma realização conjunta de Cláudio Jordão e Nelson Martins que também escreveu o argumento. É uma estória sobre pessoas singulares numa sociedade preconceituosa, um misto de fé com ignorância. Quando surgem pessoas que ameaçam o status quo o grupo tenta reprimi-las. Isto acaba por suceder com consequências devastadoras. A menina, que ouvia o vento e o sentia, una com a natureza, acaba por conhecer a maldade do ser humano. Como o bom selvagem de Rousseau, a humanidade corrompe-a para, em última análise, a tornar igual a eles. De notar, o recurso à animação 3D que faz de o “Conto do Vento” uma grande trip visual, que não será adequada para o espectador com maior sensibilidade, nomeadamente, quem sofre de vertigens. A narração de Maria D’Aires, a sobreposição da voz da menina com a mãe, da inocência com a experiência, palavras transportadas pelo vento está fantástica. E é uma das grandes forças da produção apoiando, as imagens já de si poderosas. O “Conto do Vento” é uma criação portuguesa imprescindível.

Realização: Cláudio Jordão e Nelson Martins
Argumento: Nelson Martins
Maria D'aires (voz)

Se “Bats in the Belfry” é o melhor das referências estrangeiras, em língua inglesa, a pensar num público universal e feito sem praticamente sem apoios, o “Conto do Vento” é o melhor do Portugal ancestral, de interior e tradicional, pensado como reflexão do que é ser português, falado na língua de Camões e com o financiamento do ICA/Ministério da Cultura e da RTP. São diferentes modos de pensar animação. Ambos possuem os seus méritos ou não tivessem tido o acolhimento do público e de júris a nível internacional. No entanto, urge pensar o cinema com uma perspectiva artística e de mercado. Não é “Bats in the Belfry”, um produto tão meritório por si próprio, que mereça o escrutínio das entidades públicas cujo projecto de existência é precisamente o de apoiar a cultura nacional? É apenas o Portugal tradicional, supersticioso e às vezes comezinho, o único que pretendemos mostrar lá fora?


Próximo Filme: "Tumbok, 2011"

2 comentários:

  1. Gostaria apenas de acrescentar que o filme "Bats in the Belfry" que tão justamente aprecia ganhou também o Prémio Jovem Cineasta Português (categoria de Primeiro Filme de Jovens Realizadores entre os 18 e 30 anos)no CINANIMA 2011 - Festival Internacional de Cinema de Animação de Espinho, um Festival que irá celebrar a sua 36ª edição em Novembro de 2012.

    ResponderEliminar
  2. Fica feita a nota. No entanto, enfatizo que esta é uma mini-apreciação pelo que optei por mencionar apenas alguns prémios. Senão teria de pôr uma lista ainda extensa de prémios quer do "Bats in the Belfry", quer do "Conto do Vento".

    ResponderEliminar