domingo, 14 de outubro de 2012

"Zebraman", 2004



Ao fim de cinco minutos já sabemos que o Shin'ichi Ichikawa (Shô Aikawa) é um pobre coitado digno de pena. A palavra “falhado” parece estar escrita na testa dele. É um solitário que não tem o respeito de ninguém, nem mesmo dos próprios alunos que não lhe reconhecem a autoridade. O próprio filho, um puto magricela sem espinha dorsal, também está destinado à perseguição implacável dos colegas de turma até ao final do percurso escolar. Pouco o ajuda que o pai seja professor na mesma escola que ele. Estão bem a ver o filme? Se o Ichikawa lhes der más notas, os colegas descarregam no filho. A filha dele não é muito melhor. Acabada de sair da adolescência leva a vida que quer, sem repreensão dos adultos e muito provavelmente prostitui-se para suprir os gostos mais requintados. Para completar o trio infeliz que constitui a família de Ichikawa está uma mulher que o desautoriza à frente dos filhos e o impede de tomar decisões com a sua personalidade dominante.
Como é não havia ele de se refugiar num mundo de fantasia, onde existem super-heróis que lutam contra a injustiça, essa mesma que ele conhece demasiado bem. A obsessão de Shin'ichi recai sobre uma série de televisão que nunca teve grande sucesso, injustamente esquecida: “Zebraman”. O final do dia é o único alívio. Refugia-se no quarto e admira o fato costurado por ele, enquanto fantasia, ir além daquelas paredes e percorrer as ruas da cidade, combatendo os maus e conquistando o reconhecimento que lhe falta dentro de casa.
Quando finalmente se aventura na cidade Ichikawa adquire a coragem que lhe falta como professor falhado e sucede na luta contra um vilão. Entretanto, Shinpei (Naoki Yasukoshi) um pequeno numa cadeira de rodas é introduzido na sua turma e cedo descobre que também ele nutre admiração pelo Zebraman e, ao contrário de todos os outros, vê através da personalidade sensível do professor. Shinpei e a sua mãe Kana (Kyoka Suzuki) completam a vida dupla de Ichikawa, um homem desesperado por afecto. Um retrato negro das relações familiares que se vai tornando cada vez mais alegre com o passar dos minutos e se torna algo completamente diferente.
Zebraman podia ser qualquer herói não fosse o facto de encarnar um animal muito menos sinistro que um morcego ou uma aranha. Quem tem medo de uma zebra? Onde está a complexidade do animal da savana africana que se serve de riscas para confundir os predadores? Onde é que uma zebra cria temor num vilão? Por outro lado, o facto de o homem criar uma vida dupla, na qual encontra um “filho” e uma “mulher” substitutos, apesar de nunca se consumar uma relação com esta última, pode ser condenável e alienar parte da audiência. O encontro entre as duas “famílias” deve ser qualquer coisa de desconfortável. Não é suposto “Zebraman” ser uma paródia? A partir da segunda metade do filme, quando finalmente se “esquece” a verdadeira família de Ichikawa e a cruzada como “Zebraman” começa a tomar forma, torna contornos muito semelhantes aos da velhinha série dos “Power Rangers” mas sem a narrativa totalmente inócua e açucarada. Fazer de alienígenas os vilões também contribui para nos distanciarmos de toda a seriedade inicial. Ainda mais quando nos apercebermos que os efeitos especiais deixam muito desejar. Sobretudo os pequenos aliens fazem lembrar o videoclipe dos anos 90 “Blue” dos Eiffel 65, que na altura parecia muito boa ideia mas hoje em dia ninguém se atreve a cantar em público, por medo de ser alvo de chacota. Quando o herói por fim se veste de zebra, não há como o levar a sério. O único país do mundo onde talvez se pudesse levar “Zebraman” a sério é o Japão, local onde as jovens se vestem de Lolitas e homens crescidos se vestem de bebé anseando que lhes troquem a fralda. Só lá é que Miike, um realizador mais conhecido por filmes ultra-violentos podia fazer um filme adequado a toda família apesar das disfunções mal disfarçadas. Três estrelas

Realização: Takashi Miike
Argumento: Takashi Miike
 Shô Aikawa como Shin'ichi Ichikawa
Naoki Yasukoshi como Shinpei Asano
Kyoka Suzuki como Kana Asano

Próximo Filme: "Warriors of the Rainbow: Seediq Bale", 2011

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