domingo, 8 de abril de 2012

"The Man from Nowhere" (Ajeossi, 2010)



Diz que ele surgiu do nada. Forte e brutal como sempre são os homens movidos pelo desejo de vingança. Ele não esquece e ele não pára. Por trás da espessa cabeleireira que lhe esconde uns olhos tímidos está também um homem magoado que tudo fará para isso não suceda de novo. Ele isola-se, ele cria uma nova vida, uma nova identidade. Ele desaparece do mapa e reaparece num antro de perdição e pequena criminalidade, onde as crianças são deixadas ao abandono e têm como progenitoras, prostitutas drogadas que lhes chamam “lixo”. Mas ele não quer saber disso, ele não quer saber de nada, escondendo-se atrás do cabelo espesso, atrás das grades da sua loja de penhoras. Dá para ir vivendo, “sem me preocupar com nada, sem me envolver”. So-mi (Sae-ron Kim) é uma pequena endiabrada, nascimento indesejado, um grande fardo. Ela sobrevive à custa de pequenos furtos e de se imiscuir na casa dos vizinhos que lhe dão de comer. Se não, provavelmente, a mãe não se lembrava dela. Cha Tae-sik (Bin Won) tem a sua preferência. A menina vê o que está além do cabelo desgrenhado, da tez endurecida e vê nele o seu protector. Um paizinho emprestado. A sua relutância está lá, sempre presente, resultado de um passado que ela não conhece nem lhe interessa. Ela preocupa-se com ele e quer que ele faça parte da vida dela. Certo dia, Hyo-jeong (Hyo-Seo Kim), a sua mãe arranja sarilhos com as pessoas erradas. Gangsters da pior espécie e ambas acabam por ser raptadas. O insensível, inacessível Tae-sik, sente o peso da responsabilidade de procurar uma criança que ninguém procura, ou deseja e algo desperta dentro de si. O “velho” Tae-sik, que vem de nenhures volta à superfície e recusa-se a parar, até encontrar So-mi a única neste mundo, que não se esqueceu dele. Tae-sik aterra num antro de corrupção, tráfico de droga, órgãos e mão-de-obra escrava, o submundo do crime no seu pior. Estes julgam que Tae-sik é um novo jogador, que por tanto atrevimento deverá ser eliminado. A polícia, sempre um passo atrás do homem que veio de nenhures julga-o um criminoso perigoso que deverá ser detido a qualquer custo.
Filmes de perseguições implacáveis, de vinganças bestiais são uma realidade comum no cinema coreano. Muitos são os artigos que focam a obsessão pela vingança do cinema coreano. A trilogia da vingança de Chan-wook Park, “I saw the devil”, “Bedevilled”, são impreterivelmente referidos e também infalivelmente de uma qualidade superior. “The Man From Nowhere” não é a excepção. Com um argumento bem construído, um personagem principal intrincado, uma actriz-criança talentosa e o histórico que assiste a este filme, o que podia falhar? Na verdade, um dos aspectos mais interessantes de “The Man from Nowhere” é a perspectiva tripartida: heróis, maus e polícia. Temos um gosto de todos os mundos, que nos permite conhecer todas as partes, mesmo que a maioria das vezes os maus continuem a ser muito maus e os polícias pouco espertos. Há muito pouco daquela vingança cega a que se assiste em quase todos os maus filmes de vingança, de um herói muito bom contra o mundo. Além disso, o prólogo, apesar de parco em informação acerca da história de Cha Tae-sik, é rico na compreensão da relação entre ele e So-mi. Mas além da mãe viciosa e dos maus de malicia elevada ao extremo também existe um Ramrowan (Thanayong Wongtrakul), um alívio bidimensional por poucas falas que tenha.
Jeong-beom Lee, apenas no seu segundo filme, constrói uma bela peça de vingança sem cair na brutalidade por si própria e capitaliza com sucesso sobre o talento de Bin Won que com uma meia dúzia de filmes no currículo, incluindo “Mother” (2009), onde desempenhou o papel de um jovem um pouco lento injustamente acusado de homicídio é, hoje considerado um dos actores mais populares da Coreia do Sul.
Se por um lado, “The Man from Nowhere” tem uma mensagem de esperança, no facto de haver alguém disposto a lutar por quem não tem nada, nem sequer perspectivas de vida, por outro, é um retrato assustador de uma sociedade indiferente. Se não tivermos um herói, mais ninguém irá tentar resgatar os inocentes das teias do mal. Três estrelas e meia.

Realização: Jeong-Beom Lee
Argumento: Jeong-Beom Lee
Bin Won como Cha Tae-sik
Sae-ron Kim como So-mi
Hyo-seo Kim como Hyo-jeong
Thanayong Wongtrakul como Ramrowan
Seong-oh Kim como Jong-seok
Hee-won Kim como Man-seok
Tae-hoon Kim como Chi-gon Kim



Próximo Filme: "Silk" (Gui Si, 2006)

1 comentário:

  1. Gosto muito!

    Uma prova cabal e pragmática de como as melhores histórias de vingança em Cinema, hoje em dia, provêm da Ásia (nomeadamente, Coreia do Sul e Japão).

    Cumps cinéfilos.

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