domingo, 29 de junho de 2014

"The Neighbors" (Ee-oot Salam, 2012)


O vizinho na verdadeira acepção da palavra é uma espécie em via de extinção. Longe estão os dias em que se conheciam todos os vizinhos no mesmo prédio ou das vivendas mais próximas. A cultura do indivíduo toma cada vez mais a primazia sobre as relações humanas, impedindo que se formem os laços de entreajuda que valiam aos nossos antepassados. Assim, muitos factos escandalosos escapam até ao olhar atento do vizinho mais atento...

Em “Neighbors” os residentes de um pequeno complexo de apartamentos  vêem a sua existência pacata em perigo quando uma série de homicídios sucedem dentro da sua área de conforto. A mais recente vítima, Yeo-seon (Sae-ron Kim) vivia no seu prédio. A despeito do acontecimento trágico, eles até podiam esquecer o sucedido e prosseguir com a vida normal não fosse o comportamento muito suspeito do novo vizinho Seung-hyuk (Sung-kyun Kim). Quase todos têm alguma interacção estranha com Seung-hyuk e cedo se estabelece que ele deve ser o assassino da criança. Levanta-se pois uma nova questão, com o comportamento cada vez mais descuidado do assassino e com novas vítimas a surgir, quem será capaz de denunciar o vizinho?

“Neighbors” faz recordar um fenómeno que alguns terão estudado em psicologia ou com o qual se terão cruzado se gostam de canais como o “Biography” denominado de Efeito Genovese. Este é assim denominado, após o estudo por psicólogos de um caso que chocou a América nos anos 60, quando Catherine Genovese foi atacada e esfaqueada até à morte, durante meia hora, os seus gritos e ataque inicial testemunhados por cerca de duas dezenas de pessoas. Ninguém foi capaz de a acudir e o telefonema para a polícia também foi realizado tardiamente. Genovese viria a morrer no hospital. “Neighbors” apresenta também uma panóplia de personagens que, por diversas razões se desresponsabilização da decisão que poderá levar à captura do criminoso, transferindo o ónus para qualquer outro que não eles próprios. Decisão ainda mais premente quando a polícia não possui ainda qualquer pista substancial que o leve a uma prisão.
Kyung-hee (Yun-jin Kim) encontra-se à beira da loucura, tal é a culpa que sente por não ter ido buscar a enteada à escola. Nesse dia a criança desaparecia para o seu corpo ser depois encontrado mutilado, numa mala de viagem. Agora, Kyung-hee vê o fantasma da enteada chegar todos os dias a casa. Entretanto, Sang-yoon (Ji-han Do) verifica um padrão peculiar num dos residentes do condomínio. Ele faz uma entrega de pizza na mesma casa sempre que desaparece uma pessoa. Yong-nam Jang (Tae-Seon Ha) é uma mãe com pouco que fazer e passa o tempo todo a fazer planos para o condomínio, mesmo que isso implique envolver o novo vizinho esquisito e reticente. Aliás, ela encontra-se tão ocupada que descura a própria filha, ela que é uma fotocópia da menina que foi encontrada morta (interpretada pela mesma actriz Sae-ron Kim). Quanto a vós não sei mas se fosse minha filha estaria muito preocupada.
Sang-young (Ha-ryong Lim) é o dono de uma loja de malas de viagem da qual um homem misterioso se tornou cliente assíduo. Jong-rok (Ho-jin Cheon) é um dos seguranças do condomínio que pretende passar despercebido. No entanto, ele sente afinidade pela filha da vizinha da associação de condóminos e não vê com bons olhos o interesse que um dos novos vizinhos parece tomar por ela. Hyuk-Mo (Dong-sok Ma) é um gangster e um bruto impiedoso com quem se atravessa nos seus planos, mesmo que isso signifique apenas não saber estacionar um carro. Todos absorvidos pela sua realidade de tal modo que não vêem ou fingem não ver o que é óbvio. Naquele microcosmos, mesmo que se conheçam não se relacionam além do superficial. Nem o desejam. Que quanto menos souberem melhor. O instinto de auto-preservação é superior à solidariedade. A seu tempo, vão formando uma ideia da realidade e entram num estado de dissonância cognitiva. Será que vão agir? Mais, será que vão agir a tempo? Apesar de ser um elenco vasto, os personagens são facilmente identificáveis e o argumento é excelente a veicular as suas motivações. Não querem perder o trabalho, não querem que sejam descobertos os seus segredos, acham que não é o seu papel… A força do elenco perde-se no tempo que demora a interligar as estórias individuais. Também o casting de Sae-ron Kim nas duas personagens menores é duvidoso. A jovem é talentosa e compreende-se o objectivo da parecença da vítima e de um alvo potencial, por um lado o humor instável da mãe e, por outro, despoletar os instintos homicidas do criminoso, mas bastava apenas que fosse uma actriz fisicamente semelhante. Além disso, o fantasma surge em demasia. Se a ideia era enfatizar o assombro de Yoo-jin com a sua própria culpa a ideia foi apresentada e repetida por demais pois que chega um momento em que nos questionamos se é um fantasma das mentes dos culpados ou o espectro é real. Aspectos sobrenaturais à parte, “Neighbors” é um thriller à boa maneira coreana: leva o seu tempo mas é eficaz. Três estrelas.

O melhor:
- Elenco
- Narrativa fragmentada permite ter insight sobre o que se passa na cabeça de cada um dos personagens sem alienar
- Suspense

O Pior:
- Elemento sobrenatural. Quando é que os argumentistas coreanos vão aprender que não precisam de acrescer elementos de outros géneros se estória inicial tem qualidade por si só?
- Demasiado tempo para interligar as estórias individuais


Realização: Hwi Kim
Argumento: Hwi Kim e Pool Kang (banda-desenhada)
Yun-jin Kim como Kyung-hee
Sung-kyun Kim como Seung-hyuk
Ji-han Do como Sang-yoon
Tae-Seon Ha como Yong-nam Jang
Sae-ron Kim como Yeo-Seon/Sooyeon
Ha-ryong Lim como Sang-young
 Ho-jin Cheon como Jong-rok
Dong-sok Ma como Hyuk-Mo

Próximo Filme: Jeritan Kuntilanak, 2009

domingo, 22 de junho de 2014

"The Forbidden Door" (Pintu Terlarang, 2009)


Vamos lá supor por um momento, que queriam iniciar-se nos caminhos do terror indonésio. A julgar pelos filmes aqui abordados anteriomente, e à excepção dos filmes de artes marciais de São Gareth Evans, é difícil não ficar com a impressão que o cinema de terror oriundo deste país é terrível. E a verdade é... Faça-se suspense… Vá, um pouco mais… É que não estão muito longe da realidade. A produção em série no seu pior encontra-se nos cinemas deste arquipélago. O filme de terror, a comédia e o mix destes dois géneros dominou, durante muitos anos o panorama cinematográfico do país. A fórmula é a mesma: um grupo de jovens estupidamente giros (quase todos), uma conveniente viagem ou visita de estudo, a ausência de adultos e/ou de qualquer sentido de responsabilidade e um monstro baseado numa das muitas lendas locais disponíveis. Acompanhe-se a fórmula por uma péssima execução técnica, incluindo um elenco tão capaz de proferir falas memorizadas como o cidadão normal, argumento que parece ter sido escrito por um estudante de liceu, montagem horrível, banda-sonora que é uma cópia dos 39583957405 filmes anteriores, caracterização e efeitos digitais que mais valia não se terem esforçado. Ainda estão comigo? Agora imaginem que “The Forbidden door”, é o oposto do que acabei de descrever.

Gambir (Fachri Albar) é um escultor cuja vida é radicalmente alterada quando a namorada Talyda (Marsha Timothy) engravida. Sem condições de criar um filho e ainda sem a bênção dos pais dela, ela faz um aborto. Enlouquecida pela dor, pede a Gambir que homenageie o filho morto, colocando o corpo numa das suas esculturas. Gambir acede e pouco tempo depois a situação é bem diferente. Eles encontram-se agora casados e as suas esculturas de mulheres grávidas fazem um sucesso tremendo. Mas por baixo da máscara de sucesso, Gambir tem o coração despedaçado. Ele nunca recuperou da perda do filho e isso trouxe-lhe problemas para a intimidade. É invejado por todos pela mulher linda e inteligente, mas impressiona-o a recém-formada frieza dele. Pior, é pressionado pela mãe para que lhe dê um neto. Como se não bastasse, ele começa a ver uma mensagem em todos os lugares de alguém a pedir socorro. Até onde o mistério o irá levar?

“The Forbidden Door” parece saído de um episódio da “Twilight Zone” para maiores de 18. A ajudar estão o décor retro e o ambiente artificial dos anos 50. O protagonista tem a cabeça num caos e age em conformidade. São todos à volta, e sobretudo Talyda, que se sentem demasiado seguros de si próprios. Os personagens instilam uma confiança que ninguém sente no mundo real. E se todos têm os seus problemas e frustrações, em “The Forbidden Door” tudo vai bem naquele aquário. O mundo deles é perfeito. E já que se fala em perfeição, a cinematografia é fora de série. As cores outonais são reminiscentes dos contos de fadas, com a dualidade que lhe é tão presente, de aparência bela mas esconde podridão. E não precisamos de ser confrontados com uma porta intrigante para chegar a essa conclusão. Aí reside um dos maiores pecados de “The Forbidden Door”, a previsibilidade. Curioso que filmes que estrearam em simultâneo que sofriam do mesmo mal obtiveram maior sucesso de bilheteira que “The Forbidden Door”. Outros dos problemas do filme são os vários finais que deixam a ideia de insatisfação ou pelo menos, a necessidade de um corte mais decidido assim como o tempo que demorou até chegar ao gore. Não sou de vender a minha verdade como incontestável e decerto que “The Forbidden Door” não agradará a todos, mas estranho que quando estreia um filme de execução e criatividade superiores seja deixado para trás, quando a qualidade média deixa muito a desejar. Custa mais pensar do que entregar-nos aos velhos vícios não é? Três estrelas.

Realização: Joko Anwar
Argumento: Joko Anwar e Sekar Ayu Asmara (livro)
Fachri Albar como Gambir
Marsha Timothy como Talyda
Ario Bayu como Dandung
Otto Djauhari como Rio
Tio Pakusodewo como Koh Jimmy
Henidar Amroe como Menik Sansongko
Verdi Solaiman como John Wongso
Putri Sukardi como Ibu


O melhor:
O elenco.
Cinematografia. O visual é fantástico.
Cenário.

O pior:
Vários Finais.
Rítmo lento.
Demora algum tempo até às primeiras gotas de sangue.

Próximo Filme: "The Neighbors" (Ee-oot Salam, 2012)

domingo, 15 de junho de 2014

Pee Mak Phrakanong, 2013


Passaram-se seis anos, desde que estreou “4bia”, uma pequena antologia de terror, que viria a juntar um dos quartetos com a química mais fantástica que já passou pelo ecrã e provou (caso ainda persistissem duvidas), que comédia e terror constituem um casamento mágico. 

“Pee Mak Phrakanong” foca a estória de Mak (Mario Maurer) um soldado que regressa para os braços da mulher que deixou grávida, Nak (Davika Horne) depois de ter sido forçado a ir combater para a guerra. Consigo traz quatro camaradas com quem firmou uma amizade para o resto da vida Ter (Nuttapong Chartpong), Aey (Kantapat Permpoonpatcharasuk), Shin (Wiwat Kongrasri) e Puak (Pongsathorn Jongwilak) respectivamente. (Desafio-vos a ler o nome dos actores em menos de 10 segundos!) Na aldeia o recém-chegado não é recebido da melhor forma: corre o rumor que Nak faleceu durante o nascimento do filho de ambos e assombra agora o local. Nak ignora os avisos e corre para o conforto do lar providenciado por Mak onde esta o recebe como se nada se tivesse passado. Os seus quatro amigos cedo apresentam as mesmas suspeitas que os aldeões mas, como avisar Mak que o amor da sua vida é um fantasma? Pior, como avisar Mak sem atrair a ira de Nak?

A estória baseia-se na lenda de Mae Nak, uma mulher que morre durante o parto mas se recusa a deixar o mundo dos vivos para atender ao marido Mak. Quem se opõe a tal ligação acaba morto até que Mak, por fim, descobre a verdade e foge. Segundo versões diversas da lenda, a alma de Nak é libertada mediante o ritual do exorcismo ou capturada num recipiente. A lenda é especialmente venerada como a prova mais forte do amor conjugal capaz de ultrapassar até a morte. Esta versão cienamtográfica é mais leve e reinventa a estória sem se afastar das linhas gerais e sem se escusar, no entanto, a momentos sinistros. “Pee Mak Phrakanong” ficou em boas mãos, pois tem associados Banjong Pisanthanakun e Chantavit Dhanasevi que colaboraram no argumento das antologias “4bia” e “5bia”, sendo que este último também protagonizou o não menos original “Coming Soon” e o quarteto cómico maravilha participou nas antologias já mencionadas. Todos habituados ao delicado acto de equilibrismo entre comédia e terror.

Confirma-se a falta a gravidade da lenda que inspirou o filme desde o primeiro sorriso, negro, do elenco, (a sério, uma marca de pasta de dentes podia ganhar rios de dinheiro tendo-os por representantes). É que nem a belíssima Davika Horne com a sua tez branca que faz concorrência às marcas de detergente, escapa a um sorriso destroçado! Some-se à dentição podre, penteados extraordinários que alternam entre a mais vulgar poupa, com uma altura que desafia a gravidade ao risco ao meio a terminar em autênticas asas! E para o caso da audiência temer fazer alguma observação sobre o facto, os actores antecipam-se e desdobram-se em piadas sobre o facto. A auto-consciência de um argumento é sempre divertida: “Isto é ridículo. E depois?” Na relação de Mak e Nak que é adorável e credível – despojem os actores de vestes parvas e comédia física e o que sobra é um jovem casal apaixonado –, é que se encontra o foco da estória mas é no quarteto fantástico que reside o segredo do sucesso deste filme. Os actores demonstram o grau de conforto de quem contracena há muitos anos em parceria. Delírio talvez, mas não seria estranho imaginar que existe de facto uma amizade entre eles. Embora o mais provável seja mesmo o talento natural para a comédia, aliado a uma excelente direcção. Com o argumento inteligente, que procura referências populares incluindo o “Rocky” (1976) ou “The Last Samurai” (2003), há espaço para o improviso e é notável o modo como os actores se alimentam da energia mútua para tornar as linhas de diálogo mais vivas. Mais, se conseguem atravessar cenas como a do jogo de mímica “Está um Fantasma entre nós”, a assombração de uma Casa Assombrada (sim, leram bem) e a fuga de canoa mais lenta de sempre que valem sobretudo pela comédia física é recomendável a visita de um médico pois têm um sério problema de falta de humor. Três estrelas e meia.
O melhor:
- A química do elenco
- Cenas de rir à gargalhada
- Comédia física

O Pior:
- A estória é sacrificada em prol da comédia (Isso é mau?)
- Caracterização dos actores. Havia necessidade de ir tão longe para produzir efeito cómico?

Realização: Banjong Pisanthanakun
Argumento: Banjong Pisanthanakun, Chantavit Dhanasevi e Nontra Kumwong
Mario Maurer como Mak
Davika Horne como Nak
Nuttapong Chartpong como Ter
Kantapat Permpoonpatcharasuk como Aey
Wiwat Kongrasri como Shin
Pongsathorn Jongwilak como Puak
Sean Jindachot como Ping


Próximo filme: "The Forbidden Door" (Pintu Terlarang, 2009)

Senhoras e senhores, o quarteto fantástico!

domingo, 8 de junho de 2014

"Hara-Kiri: Death of a Samurai" (Ichimei, 2011)


A afirmação de que os remakes são desnecessários é quase consensual. Qualquer pessoa com um pouco de senso-comum e, nem sequer me estou a referir a cinéfilos poderá concordar que se um filme é bom, não será indispensável refazê-lo. Mais, se a experiência prévia já não funcionou bem, para quê mexer numa fórmula que há partida já carrega o fardo do fracasso? De vez em quando sucede um pequeno milagre e a nova reincarnação resulta. A maioria das vezes, é apenas um filme terrível e até um insulto ao sentimento nostálgico da audiência. Porque é que alguém achou que refazer o clássico “The Thing” (1982) do John Carpenter é algo que me ultrapassa. Note-se que não mencionei a qualidade do remake de 2011. Também não sou ingénua a ponto de pensar que a onda de remakes se deve a algo mais que a procura desenfreada por cifrões. Quem parece passar incólume a toda esta polémica é Takashi Miike, um dos grandes realizadores japoneses que em 2010 descobriu a paixão pelo que é velho e apostou de uma assentada em apresentar a sua versão dos acontecimentos no próximo do genial “13 Assassins” (2010), a que se seguiu este “Hara Kiri: Death of a Samurai”. Onde a primeira experiência resultou altamente cansativa, ou não fossem as sequências pós-contextualização da narrativa, rápidas e furiosas, a segunda revela-se um affair bem mais calmo e contemplativo. Desengane-se quem espera os habituais laivos de loucura de Miike em “Hara Kiri”. É que a despeito do potencial da estória para o realizador-argumentista libertar os seus demónios é uma das interpretações mais subtis da sua obra.

Hanshiro Tsugumo (Ebizo Ichikawa) é um ronin (samurai sem senhor) que solicita uma audiência com o senhor de uma casa senhorial para efetuar o hara kiri (suícidio ritual). Uma forma habitual, na altura de “forçar” o anfitrião a conceder algum tipo de donativo para o pobre ex-samurai sobreviver. Com o fim da era samurai muitos tiveram dificuldade em adaptar-se aos novos tempos. Enquanto uns se converteram em artesões, agricultores, comerciantes, homens de Estado, outros, que conheciam no código samurai a sua forma de viver e o seu modo de experienciar o mundo viraram subitamente mendigos que nada mais sabiam fazer. Com vergonha da queda de estatuto e sem modo de garantir a subsistência da família, muitos cometeram suicídio. Outros encontraram na piedade dos outros um modo de ir sobrevivendo. Tsugumo seria apenas um de muitos casos desesperados, mas cedo os homens da casa entendem que as suas intenções não são aquilo que parece. A estória é entrecortada por analepses, do ponto de vista de Tsugumo e dos seus anfitriões que demonstram memórias de uma vida mais feliz por um lado e uma existência miserável, por outra. Enquanto Tsugumo apresenta uma agenda negra, mas ainda assim, com pinceladas felizes que parecem, nos momentos negros em que surgem no ecrã patéticas, os homens, liderados por Kageyu (Koji Yakusho) estão mais apostados em assustá-lo com a estória verídica e terrível de Motome (Eita Nagayama) que ali morreu, antes dele.

A narrativa é de uma morbidez típica de Miike pois é trabalhada de modo que pouco é deixado à imaginação: o sangue, a agressão, cadáveres, a miséria humana são comuns no seu corpo de trabalho. E ainda assim, este é Miike no seu mais contido e subtil. Onde filmes anteriores podiam impressionar pelo modo explícito como apresentar certas temáticas e acções dos personagens na tela, em “Hara Kiri: Death of a Samurai” a audiência é vencida pelo insistir nos pontos de pressão da família e dinheiro (tão penosos para o ser humano comum), conjugados com o brutal tempo de duração. Quando pensamos que a miséria não pode ser maior, eis que surge nova afronta. Adivinhando facilmente o desfecho não podia ser de outra forma e, ao mesmo tempo, não podíamos deixar de o temer. Perto de brilhante. Três estrelas e meia.
O melhor:
- Elenco brilhante mas um destaque particular para o actor de palco Ebizo Ichikawa
- Aspectos técnicos

O Pior:
- 3D?!
- Rítmo.
- Podiam cortar à vontade 30 minutos de miséria.

Realização: Takashi Miike
Argumento: Kikumi Yamagishi e Yasuhiko Takiguchi (livro)
Ebizo Ichikawa XI como Hanshiro Tsugumo
Eita Nagayama como Motome Chijiiwa
Hikari Mitsushima como Miho
Koji Yakusho como Kageyu Saito
Naoto Takenaka como Tajiri
Munetaka Aoki como Hikokuro Omodaka
Hirofumi Arai como Hayatonosho Matsuzaki
Kazuki Namioka como Kawabe Umanosuke
Yoshihisa Amano como Sasaki
Takehiro Hira como Naotaka Ii Kamon-no-kami
Takashi Sasano como Sosuke
Nakamura Baijaku II como Jinnai Chijiiwa

Próximo Filme: Pee Mak Phrakanong, 2013

domingo, 1 de junho de 2014

"Dark Skies", 2013


Trágico é o dia em que um casal descobre que os seus filhos se sentem acossados e eles não podem fazer nada para os proteger. 

Lacy (Keri Russel) e Daniel (Josh Hamilton) são em muitos aspectos o casal suburbano típico. Têm dois filhos, uma casa e discutem sobre dinheiro. O mais novo, Sam (Kadan Rockett) ainda aceita cegamente o que os pais lhe dizem. É Jesse (Dakota Goyo), o filho mais velho que começam a perder para a adolescência. O facto de Daniel estar desempregado e de Lacy não conseguir vender casas, começa a fazer mossa na relação. A última coisa de necessitam para aumentar a já forte pressão é os filhos serem também eles vítimas. Nada tão vulgar como serem vítimas da economia. Algo bem mais insólito. Entre estórias de um “sandman” contadas pelo petiz e desenhos perturbadores, o casal começa a notar a mudança de lugar de objectos e mobília. De súbito, o que podia ser vida quase idílica transforma-se com o medo do desconhecido. “Dark Skies” trilha os caminhos de um “Poltergeist” (1982) mas sem a boa disposição associada. Se o filme antigo era atemorizante, mas mantinha a uma distância segura a esperança de uma resolução a contentamento de todos. “Dark Skies” pega na mesma premissa, a de uma força invisível que ataca uma família mas dispara numa direcção diferente e bem mais obscura. Os acontecimentos sucedem sobretudo na noite escura, em que a visão é limitada e a imaginação descontrolada. Eis como um filme modesto se torna em algo bem superior. O desenvolvimento dos personagens, em particular, o sentimento de alarmismo que põe em causa a paz da família soa demasiado real. Se um filme é preditor de atitudes estúpidas e é certo que as há, “Dark Skies” não é excepção, de algum modo conseguimos identificar-nos com o transtorno daqueles pais e as acções mais ou menos sensatas. O terror de um casal que não sabe como explicar aos filhos o que se está a passar, de um lado da barricada uma Lacy numa pilha de nervos e do outro um Daniel que pretende manter a fachada de segurança ancorado num cepticismo que até ele, no seu interior, sabe que não o auxiliará em nada, são espantosos de se ver. É numa frente unida e não na dispersão que reside a maior força para enfrentar a ameaça.

“Dark Skies” segue a fórmula tendo apenas uma pequena reviravolta e, quanto a isso, quanto menos lerem e souberem melhor. De referir que a direcção que a estória é surpreendente pela positiva uma vez que não tem sido comum tal abordagem. Os mais exigentes irão de qualquer modo apelidar “Dark Skies” de medíocre mas vai ser sem duvida um docinho para quem procura algo diferente no género de terror sci fi.
Existe o tal personagem, o contador de estórias, como gosto de lhe chamar, que explica aos protagonistas sem noção o que se está a passar. É capaz de ser este o momento, pessoalmente, que fez o copo transbordar no que toca à credibilidade da estória. No entanto, não era inesperado. Esta personagem é tão verdadeira na Hollywood dos anos 80 [“Poltergeist” (1982)] como na do novo milénio [“Insidious” (2010)] e no cinema asiático [“Premonition” (2004)], a regra também é invariavelmente seguida.
“Dark Skies” é um filme de suspense antes de trilhar o terreno da ficção científica e é no primeiro capítulo que se encontra maior potencial. Com poucos ou nenhuns efeitos especiais, a tensão vai amontoando e quando damos por nós, o filme que até nem é pequeno, foi um bom pedaço de tempo desperdiçado. De tal modo, que fica a sensação que se tivesse havido uma maior aposta do estúdio na sua promoção podia ter tido pelo menos sucesso moderado. Três estrelas.

O melhor:
- Keri Russell percorreu um longo caminho desde “Felicity” (1998)
- Direcção inesperada

O Pior:
- Fraca concretização da ideia
- O baixo orçamento
- O marketing (que aliás “spoila” o filme)

Realização: Scott Andrew
Argumento: Scott Andrew
Keri Russel como Lacy Barrett
Josh Hamilton como Daniel Barrett
Dakota Goyo como Jesse Barrett
Kadan Rockett como Sam
J.K. Simmons como Edwin Pollard

Próximo filme: "Hara-Kiri: Death of a Samurai" (Ichimei, 2011)