quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

"Muoi: The Legend of a Portrait" (Meui, 2007)

“Muoi – Legend of a Portrait” é na sua essência um filme de gajas. Um filme de terror para gajas, vá. Podia ser um contrassenso, não estivesse já cientificamente comprovado que as mulheres também vêm filmes de terror e, às vezes, até se assustam menos que os homens. Mas não seja por isso, “Muoi” tem alguns momentos enervantes e actrizes principais giríssimas.
“Muoi – Legend of a Portrait” é um esforço conjunto de produtoras sul-coreanas e vietnamitas. É uma colaboração, no mínimo corajosa, pois que no Vietname, o filme teve de passar pela censura do Gabinete de Cinema Vietnamita e sofreu diversos cortes, de resto vitais para a compreensão da obra. No entanto, “Muoi” foi dos primeiros filmes de terror a ser produzidos no país e 2007 nem foi há muito tempo… Seja bem entendido que o Vietname é governado, à semelhança da China por um único partido, o comunista apesar de ter vindo a reestabelecer cada vez mais relações com o exterior.
“Muoi” que significa dez, em vietnamita é uma jovem rapariga pobre (Ahn Thu) que há pouco mais de um século atraiu o amor do pintor Nguyen (Binh Minh) com a sua beleza extraordinária. Infelizmente, ele também atraiu as atenções de uma herdeira poderosa (Hong Anh) que estava disposta a tudo para vencer a rival nas afeições de Nguyen. O resultado é uma maldição, a única forma da pobre Muoi se vingar sobre os ricos e poderosos que a maltrataram em vida. Diz que o modo de deter Muoi de empreender a sua vingança terrível foi aprisioná-la num retrato. Entenda-se que esta produção terá tido maiores preocupações que as de apontar para os problemas de justiça social como os que grassam noutros pontos do mundo, mas não deixa de ser tentador encontrar semelhanças no Portugal do século XXI, onde as desigualdades determinam o acesso à justiça. Não é pois de estranhar eventuais reservas do regime perante a história de Muoi e a tentativa de as mascarar talvez com os elementos perturbadores de terror. A narrativa encontra ecos de um trauma com os excessos da sociedade patriarcal sul-coreana da qual resulta que os personagens do sexo masculino são retratados como criaturas fracas, lideradas por instintos primitivos e as mulheres se transformam nas heroínas trágicas que granjeiam a simpatia dos espectadores.
Somos transportados para os dias de hoje, onde Yoon-hee (Jo-na) pesquisa informação para o seu próximo livro. Ela parece ter um golpe de sorte quando uma velha amiga, a viver no Vietname, a convida a conhecer o folclore local, em particular, a lenda de Muoi. Yoon-hee tem alguns esqueletos no armário, incluindo, escrever um livro pouco a nada abonatório sobre Seo-yeon (Ye-ryeon Cha) a amiga que a contactou. Elas  percorrem as paisagens inesquecíveis do Vietname como duas desconhecidas. Seo-yeon indaga sobre a vida de Yoon-hee e procura restaurar o laço perdido. Yoon-hee parece mais interessada em usar a hospitalidade da amiga para terminar o livro o mais rápido possível e regressar à Coreia. Entretanto, tenta evitar o mais possível responder a questões sobre o livro anterior. Yoon-hee é umas personagens principais mais antipáticas que já tive oportunidade de ver em película. Nem quando a verdade é trazida a descoberto ela se torna aquilo que deveria ter sido, likeable. Quanto a Seo-yeon ela é linda, vulnerável, a amiga de quem se tem pena e que gostaríamos ter sido nossa, apesar de compreendermos que por detrás das suas acções se esconde uma agenda obscura. É nestes momentos, que sucedem paralelamente ao desenrolar da história de Muoi, que se verificam as qualidades de filme de gaja. A película funciona em lume brando, centrada nas interacções entre as duas amigas, no crescer de tensão e desconforto à medida que os erros do passado são expostos. O ponto de ebulição chega rápido e furioso demais para que possamos apreciar em pormenor o que se está a passar. Quando damos por nós, o fim já veio e se foi. Atabalhoado, para um crescendo tão consistente. Valha-nos o cenário idílico, o som e tecnicismos vários que tornam o filme muito sólido ainda que tenham existido algumas falhas do ponto de vista da produção. Ao que parece, o “Ao Dai”, traje tradicional vietnamita é uma versão posterior à época é retratada no filme. Nada de grave porém. “Muoi” é uma excelente estreia para o cinema de terror vietnamita assente no know-how das produções coreanas. Três estrelas.

Realização: Tae-kyeong Kim
Argumento: Zizak e Tae-kyeong Kim
Jo-na como Yoon-hee
Ye-ryeon Cha como Seo-yeon
Ahn Thu como Muoi
Binh Minh como Nguyen

Próximo Filme: "Ring" (Ringu, 1998)

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