domingo, 22 de novembro de 2015

"Diary" (Mon seung, 2006)


Winnie (Charlene Choi) encontra-se deprimida depois de mais uma relação falhada. Após Seth (Shawn Yue) a abandonar, Winnie passa os dias a fazer bonecos, a tratar da lida da casa e escrever no seu diário. A sua vida dá uma volta inesperada quando encontra Ray que é exactamente igual ao ex-namorado. Ela dá uma nova oportunidade ao amor e acaba por conquistar Ray que rapidamente se muda para a casa da nova namorada. Winnie dá por si a cometer erros do passado com o novo amor ou será que o ciclo vicioso nunca chegou a terminar?

“Diary” é uma viagem desorientadora e aborrecida pela mente de uma personagem que poderá ou não estar no pleno das suas faculdades mentais. A viagem desorienta devido às muitas repetições e mudanças de perspectiva mas também aborrece porque, afinal, quantas vezes é que tem de mostrar a mesma cena até ao público acusar cansaço?! Todos os sinais apontam para que Winnie não seja a pessoa mais estável em termos psicológicos. Entre os vários afazeres mundanos, apercebemo-nos que Seth fez as malas e deixou-a só. Outro indício bastante óbvio é o facto de Winnie procurar criar um relacionamento com um sósia do homem que lhe partiu o coração. A sério que não havia ali ninguém para lhe dizer: “Querida, esta é capaz de não ser uma das melhores ideias de já tiveste?” Por que se o homem é igual, a personalidade pode ser em tudo diferente. Aliás, a maior parte do tempo, Ray aparenta possuir uma personalidade submissa se não, como aguentaria suportar que Winnie o tratasse por inúmeras, demasiadas vezes, pelo nome do anterior namorado. Também Winnie se contenta com pouco. As suas relações chegam sempre a um ponto em que os companheiros não se dão à tão árdua tarefa de lhe responder ou sequer reconhecer a presença dela, na sua própria casa. Mas a câmara de Oxide Pang parece querer contar uma estória distinta. Eles podem não estar ali, podem nunca ter estado ali. Se calhar é tudo uma grande partida da mente de uma Winnie que tem visões e por vezes apresenta dificuldade em discernir o que é real e o que é sonho. Charlene Choi, uma estrela da cena cantopop prova que não é apenas uma carinha laroca e mostra que possui capacidades para a representação mais do que suficientes para a interpretação de uma mulher que poderá ou não ser desequilibrada. A Shawn Yue pouco mais é dado que fazer do que se assemelhar a um vegetal, enquanto Isabella Leong, num papel fulcral para o desenlace da trama não surge em quantidade suficiente para não ser eclipsada por Choi. O enredo é um puzzle complexo cuja revelação poderá escapar a alguns ou ainda conduzir a interpretações dissemelhantes. Uma dica: a profusão de cor ou a aposta na simples cinza pode ajudar a despistar o sonho do quotidiano. Mas a despeito de uma execução técnica exemplar o fracasso reside num argumento pobre. Choi parece arrastar-se pelo ecrã a todo momento, levando com ela a pouca atenção que ainda lhe é concedida após a realização de que “Diary” não é tanto um filme de terror como um thriller dramático. Pang cai na armadilha habitual no seu currículo cinematográfico, das reviravoltas e desenlaces que… não eram necessários e mais, dão a sensação de que só existem para aumentar o tempo de duração de um filme que ainda assim só tem uns meros 85 minutos.

“Diary” é um excelente recordatório das capacidades de Oxide Pang em criar películas espantosas em termos visuais e igualmente fracas em termos narrativos. Esta constante, desde inícios do milénio até ao final da primeira década do século XXI, comprova a incapacidade de qualquer dos manos Pang e, em particular, do mais talentoso Oxide, em aprimorar a sua arte. Isto é capaz de ter algo a ver com a quantidade de filmes que já criaram até ao momento e, como é por demais sabido, a quantidade costuma ser inimiga da qualidade. Duas estrelas.

Realização: Oxide Pang Chun
Argumento: Oxide Pang Chun e Thomas Pang
Charlene Choi como Leung Wing-na (Winnie)
Isabella Leong como Yee
Shawn Yue como Seth/Ray
Hin-Wai Au como Detective

Próximo Filme: "The House at the End of Time" (La casa del fin de los tiempos, 2013)

domingo, 1 de novembro de 2015

"Crimson Peak" (2015)


Crimson Peak” abre as hostilidades com a lágrima solitária da personagem principal… gerada por um computador. Aos primeiros segundos lá estava ele, o primeiro indício do artificialismo que se faria sentir ao longo de toda a duração do filme. Para quê contratar uma Mia Wasikowska que até consegue verter todas as lágrimas desejadas, quando se pode recorrer aos efeitos digitais?

Mia é Edith Cushing, a única filha do magnata empreendedor Carter Cushing, um self-made man à boa maneira americana. Ela aspira tornar-se escritora numa época em que as mulheres ainda eram vistas como pouco mais que frágeis peças de porcelana. Apresenta-se como uma desafiadora de convenções, não quer ser uma Jane Austen mas a ideia de uma Mary Shelley não lhe desagrada. Crítica, talvez com demasiado arrojo, os seus pares, pois que não parece ter noção da sorte em ter um pai indulgente naquela época. As suas paixões sofrem um abanão sob a forma do hipnótico Thomas Sharpe (Tom Hiddleston) um baronete que veio com a irmã Lucille (Jessica Chastain) para a América para angariar fundos para a máquina de extracção de argila nas decrépitas paisagens da sua propriedade de família. Carter Cushing (Jim Beaver) é um homem vivido e com uma perspectiva muito pouco romântica da vida. Tudo quanto possui, foi obtido à custa de trabalho intenso e não vê como é que a “máquina mágica” de um baronete falido irá ajudá-lo a recuperar a glória perdida. Mais, ele sente um desconforto face aos dois irmãos, que uma Edith inexperiente não consegue detectar e que se acentua sobremaneira com as investidas amorosas de Thomas sobre a sua filha. Edith nunca chega a ter conhecimento desta suspeição pois que Carter sofre uma morte súbita, brutal. A despeito das objecções de todos quanto a rodeiam, incluindo o jovem médico Alan McMichael (Charlie Hunnam) que sempre a amou, Edith abandona a razão e a América pela paixão numa decrépita mansão inglesa. Porque ela é assim, prefere a excitação da incerteza a uma vida aborrecida. Para trás ficam também avisos além-mundo para ter cuidado com “Crimson Peak”.

A ideia de Guillermo del Toro, Tom Hiddelston, Jessica Chastain e Mia Wasikowska, unidos num mesmo drama de terror em tom romântico gótico é excelente na teoria. A qualquer deles não faltam credenciais para comprovar a existência de boas ideias e a abundância de talento e, no entanto, não se pode se não lamentar quão aquém destas capacidades “Crimson Peak” ficou. A expressão que melhor descreve “Crimson Peak” é déjà vu. Os cenários e o guarda-roupa emulam quase na perfeição o início do século XX e o ambiente sombrio (Gótico!) evocam obras de autores como Poe, as irmãs Bronte ou, mais tardiamente, um H.P. Lovecraft; e o argumento se não dista destas referências e das estórias de crimes chocantes à época ainda tem espaço para incluir referências desde então até ao novo milénio. “Crimson Peak” é uma amálgama de ideias, parentes pobres de obras primordiais de del Toro como um “Devil’s Backbone”, “Pan’s Labyrinth” ou “The Orphanage”. Não existe uma sensação de deslumbramento e curiosidade como nas obras anteriores. Onde se mantém coerência é nas magníficas criaturas que são horrendas e fascinantes em igual medida.
As personagens de del Toro têm em comum o facto de terem como ponto de partida situações de grande vulnerabilidade e é este sofrimento e conhecimento do mundo que as faz sobressair em tempos de desespero. Apresentando-se de início como uma representação feminista da mulher numa sociedade retrógrada, Edith redunda numa heroína frágil, que abandona a racionalidade por um amor perigoso. Del Toro atribui-lhe a característica que lhe é tão querida e tão premente nos seus filmes anteriores, que é a de contactar com criaturas que se encontram noutro plano da realidade. Mas se uma primeira interacção com o outro mundo, não surte efeito sobre as suas acções, o que pode ser atribuído à ingenuidade – e vá, também não custava nada às criaturas serem menos vagas e assustadoras –, nunca ela questiona o porquê de possuir esta capacidade nem o seu potencial. A completar o trio de actores principal, encontram-se um Tom Hiddelston que vai desaparecendo, em proporção aos ardores teatrais crescentes de uma Chastain demasiado imersa na personagem trágica que encarna. Ao fim de dez minutos (menos?), os papéis e a bagagem emocional das personagens é perceptível na totalidade. A pequena que se considera demasiado inteligente para seu próprio bem mas é afinal de uma ingenuidade perigosa, o homem experiente que topa a perfídia a quilómetros, o casal que advém um passado de desgraça e para lá arrasta todos quantos se cruzam no seu caminho... Enfim, personagens e estórias que a dada altura se cruzaram no caminho de cada um de nós, desde a telenovela mais carregada de melodrama às referências literárias já mencionadas… Dificilmente material original. Duas estrelas e meia.

Realização: Guillermo del Toro
Argumento: Guillermo del Toro e Matthew Robbins
Mia Wasikowska como Edith Cushing
Jessica Chastain como Lucille Sharpe
Tom Hiddleston como Thomas Sharpe
Charlie Hunnam como Dr. Alan McMichael
Jim Beaver como Carter Cushing

Próximo Filme: "Diary", (Mon Seung, 2006)
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