“Crimson Peak” abre as hostilidades com a lágrima solitária da personagem principal… gerada por um computador. Aos primeiros segundos lá estava ele, o primeiro indício do artificialismo que se faria sentir ao longo de toda a duração do filme. Para quê contratar uma Mia Wasikowska que até consegue verter todas as lágrimas desejadas, quando se pode recorrer aos efeitos digitais?
Mia é Edith Cushing, a única filha do magnata empreendedor Carter Cushing, um self-made man à boa maneira americana. Ela aspira tornar-se escritora numa época em que as mulheres ainda eram vistas como pouco mais que frágeis peças de porcelana. Apresenta-se como uma desafiadora de convenções, não quer ser uma Jane Austen mas a ideia de uma Mary Shelley não lhe desagrada. Crítica, talvez com demasiado arrojo, os seus pares, pois que não parece ter noção da sorte em ter um pai indulgente naquela época. As suas paixões sofrem um abanão sob a forma do hipnótico Thomas Sharpe (Tom Hiddleston) um baronete que veio com a irmã Lucille (Jessica Chastain) para a América para angariar fundos para a máquina de extracção de argila nas decrépitas paisagens da sua propriedade de família. Carter Cushing (Jim Beaver) é um homem vivido e com uma perspectiva muito pouco romântica da vida. Tudo quanto possui, foi obtido à custa de trabalho intenso e não vê como é que a “máquina mágica” de um baronete falido irá ajudá-lo a recuperar a glória perdida. Mais, ele sente um desconforto face aos dois irmãos, que uma Edith inexperiente não consegue detectar e que se acentua sobremaneira com as investidas amorosas de Thomas sobre a sua filha. Edith nunca chega a ter conhecimento desta suspeição pois que Carter sofre uma morte súbita, brutal. A despeito das objecções de todos quanto a rodeiam, incluindo o jovem médico Alan McMichael (Charlie Hunnam) que sempre a amou, Edith abandona a razão e a América pela paixão numa decrépita mansão inglesa. Porque ela é assim, prefere a excitação da incerteza a uma vida aborrecida. Para trás ficam também avisos além-mundo para ter cuidado com “Crimson Peak”.
A ideia de Guillermo del Toro, Tom Hiddelston, Jessica Chastain e Mia Wasikowska, unidos num mesmo drama de terror em tom romântico gótico é excelente na teoria. A qualquer deles não faltam credenciais para comprovar a existência de boas ideias e a abundância de talento e, no entanto, não se pode se não lamentar quão aquém destas capacidades “Crimson Peak” ficou. A expressão que melhor descreve “Crimson Peak” é déjà vu. Os cenários e o guarda-roupa emulam quase na perfeição o início do século XX e o ambiente sombrio (Gótico!) evocam obras de autores como Poe, as irmãs Bronte ou, mais tardiamente, um H.P. Lovecraft; e o argumento se não dista destas referências e das estórias de crimes chocantes à época ainda tem espaço para incluir referências desde então até ao novo milénio. “Crimson Peak” é uma amálgama de ideias, parentes pobres de obras primordiais de del Toro como um “Devil’s Backbone”, “Pan’s Labyrinth” ou “The Orphanage”. Não existe uma sensação de deslumbramento e curiosidade como nas obras anteriores. Onde se mantém coerência é nas magníficas criaturas que são horrendas e fascinantes em igual medida.
As personagens de del Toro têm em comum o facto de terem como ponto de partida situações de grande vulnerabilidade e é este sofrimento e conhecimento do mundo que as faz sobressair em tempos de desespero. Apresentando-se de início como uma representação feminista da mulher numa sociedade retrógrada, Edith redunda numa heroína frágil, que abandona a racionalidade por um amor perigoso. Del Toro atribui-lhe a característica que lhe é tão querida e tão premente nos seus filmes anteriores, que é a de contactar com criaturas que se encontram noutro plano da realidade. Mas se uma primeira interacção com o outro mundo, não surte efeito sobre as suas acções, o que pode ser atribuído à ingenuidade – e vá, também não custava nada às criaturas serem menos vagas e assustadoras –, nunca ela questiona o porquê de possuir esta capacidade nem o seu potencial. A completar o trio de actores principal, encontram-se um Tom Hiddelston que vai desaparecendo, em proporção aos ardores teatrais crescentes de uma Chastain demasiado imersa na personagem trágica que encarna. Ao fim de dez minutos (menos?), os papéis e a bagagem emocional das personagens é perceptível na totalidade. A pequena que se considera demasiado inteligente para seu próprio bem mas é afinal de uma ingenuidade perigosa, o homem experiente que topa a perfídia a quilómetros, o casal que advém um passado de desgraça e para lá arrasta todos quantos se cruzam no seu caminho... Enfim, personagens e estórias que a dada altura se cruzaram no caminho de cada um de nós, desde a telenovela mais carregada de melodrama às referências literárias já mencionadas… Dificilmente material original. Duas estrelas e meia.
Realização: Guillermo del Toro
Argumento: Guillermo del Toro e Matthew Robbins
Mia Wasikowska como Edith Cushing
Jessica Chastain como Lucille Sharpe
Tom Hiddleston como Thomas Sharpe
Charlie Hunnam como Dr. Alan McMichael
Jim Beaver como Carter Cushing
Próximo Filme: "Diary", (Mon Seung, 2006)
Realmente foi um filme que também não apreciei muito, esperavam ais do Del Toro. Visualmente achei estonteante mesmo com os recursos ao digital, é algo que já nos vem habituando nos últimos anos e através do qual é conhecido criando cenários oníricos únicos. A parte menos boa é mesmo o argumento, cliché e pouco coeso, com imensos plot holes e chega a um ponte de ser aborrecido e irritante, terminando com um fim que pouco tem de intenso ou interessante....
ResponderEliminarBons filmes,
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