Passado dia 14 de Março, tive oportunidade de assistir à cerimónia de entrega dos prémios Cineuphoria, destinados a reconhecer a produção cinematográfica estreada no ano anterior em Portugal quer em salas de cinema, televisão, internet ou festivais de cinema, e devidamente publicados no CinEuphoria (…)
A iniciativa, organizada em colaboração com o Portugal Fantástico foi uma celebração da produção nacional com a exibição de curtas-metragens portuguesas: “Bats in the Belfry”, “Conto do Vento”, “A Cova”, “Faminto”, “O Vôo da Papoila”, “S.C.U.M” e “Shadows”.
Foi uma excelente oportunidade de conhecer a ficção nacional e foi curioso notar como a maioria das curtas apostaram em estórias fantásticas e/ou de acção. Mas foram as curtas de animação que roubaram o espectáculo.
“Bats in the Belfry” (2010)
“Bats in the Belfry” é uma curiosa expressão inglesa que significa alguém que é um pouco tonto ou não está bom da cabeça. Bats são morcegos e belfry é o campanário. Por isso, se alguém tem morceguinhos no campanário é porque não bate bem da cuca, coitado. Ricos morceguinhos teve o João Alves que fez tudo o que era humanamente possível nesta curta-metragem: realização, produção, argumento, voz, música e montagem.
Bats in the Belfry narra a história de Deadeye Jack que após uma frustrada tentativa de assalto durante o dia, tenta retomá-lo usando a noite como cobertura mas ao surpreender os donos do dinheiro, Jack interrompe uma refeição da qual se arrisca a tornar-se o prato principal.
Deadeye Jack é o tipo loner dos westerns spaghetti que só quer estar na dele. Dar um golpe de vez em quando para o gastar em bebida e mulheres. Cada um com os seus vícios e ele não deve nada a ninguém. No fundo, é um tipo simples que só quer ser deixado em paz. Apenas não tem nada de deadeye, quando saca da pistola é mortal. Até que durante um golpe se depara com vampiros. Sim, vampiros no velho faroeste. Depois de alienígenas em westerns e zombies no século XXI, não é como se fosse um absurdo. “Bats in the Belfry” tem reunido entretanto, uma série de prémios incluindo o de melhor curta de terror portuguesa no MOTELx 2010, melhor animação de 2010 do Shortcutz Lisboa e o melhor jovem realizador de 2011 do Fantasporto. Até faz parte da selecção oficial do "A Night of Horror International Film Festival" na Austrália, quase nos antípodas de Portugal! A geração dos anos 90 que cresceu com “Samurai Jack” e Dexter’s Lab” encontrará nestas as séries as referências essenciais para esta obra de João Alves. Um docinho para os mais saudosos, uma curiosidade para os novos fãs. "Bats in the Belfry” é uma obra inteligente, que junta comédia e terror aproveitando a obsessão actual com tudo o que é fantástico: mortos-vivos, vampiros, monstros... A ver!
Realização: João Alves
Argumento: João Alves
João Alves como Deadeye Jack (voz)
Rita Soares como Mulher (voz)
“Conto do Vento” (2010)
Desde que estreou no Festival Avanca 2010, nunca mais parou. Bóreas acolheu o “Conto do Vento” nos seus braços de titã e levou-o, com o vento, por esse mundo fora, colhendo prémios. Na Grécia, recebeu o Prémio Animação do Naoussa International Film Festival 2011, na Albânia, recebeu a distinção de "Melhor Filme de Animação" do Festival Internacional de Cinema de Tirana e no Brasil, foi eleito o melhor filme da Mostra Ibero-Americana do Festival Visões Periféricas e continua a arrecadá-los por onde passa.
É uma fábula sobre uma menina e a sua mãe numa sociedade preconceituosa, algures no interior norte de uma aldeia portuguesa.
“Conto do Vento” é uma realização conjunta de Cláudio Jordão e Nelson Martins que também escreveu o argumento. É uma estória sobre pessoas singulares numa sociedade preconceituosa, um misto de fé com ignorância. Quando surgem pessoas que ameaçam o status quo o grupo tenta reprimi-las. Isto acaba por suceder com consequências devastadoras. A menina, que ouvia o vento e o sentia, una com a natureza, acaba por conhecer a maldade do ser humano. Como o bom selvagem de Rousseau, a humanidade corrompe-a para, em última análise, a tornar igual a eles. De notar, o recurso à animação 3D que faz de o “Conto do Vento” uma grande trip visual, que não será adequada para o espectador com maior sensibilidade, nomeadamente, quem sofre de vertigens. A narração de Maria D’Aires, a sobreposição da voz da menina com a mãe, da inocência com a experiência, palavras transportadas pelo vento está fantástica. E é uma das grandes forças da produção apoiando, as imagens já de si poderosas. O “Conto do Vento” é uma criação portuguesa imprescindível.
Argumento: Nelson Martins
Maria D'aires (voz)
Se “Bats in the Belfry” é o melhor das referências estrangeiras, em língua inglesa, a pensar num público universal e feito sem praticamente sem apoios, o “Conto do Vento” é o melhor do Portugal ancestral, de interior e tradicional, pensado como reflexão do que é ser português, falado na língua de Camões e com o financiamento do ICA/Ministério da Cultura e da RTP. São diferentes modos de pensar animação. Ambos possuem os seus méritos ou não tivessem tido o acolhimento do público e de júris a nível internacional. No entanto, urge pensar o cinema com uma perspectiva artística e de mercado. Não é “Bats in the Belfry”, um produto tão meritório por si próprio, que mereça o escrutínio das entidades públicas cujo projecto de existência é precisamente o de apoiar a cultura nacional? É apenas o Portugal tradicional, supersticioso e às vezes comezinho, o único que pretendemos mostrar lá fora?
Próximo Filme: "Tumbok, 2011"
Gostaria apenas de acrescentar que o filme "Bats in the Belfry" que tão justamente aprecia ganhou também o Prémio Jovem Cineasta Português (categoria de Primeiro Filme de Jovens Realizadores entre os 18 e 30 anos)no CINANIMA 2011 - Festival Internacional de Cinema de Animação de Espinho, um Festival que irá celebrar a sua 36ª edição em Novembro de 2012.
ResponderEliminarFica feita a nota. No entanto, enfatizo que esta é uma mini-apreciação pelo que optei por mencionar apenas alguns prémios. Senão teria de pôr uma lista ainda extensa de prémios quer do "Bats in the Belfry", quer do "Conto do Vento".
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