O vizinho na verdadeira acepção da palavra é uma espécie em via de extinção. Longe estão os dias em que se conheciam todos os vizinhos no mesmo prédio ou das vivendas mais próximas. A cultura do indivíduo toma cada vez mais a primazia sobre as relações humanas, impedindo que se formem os laços de entreajuda que valiam aos nossos antepassados. Assim, muitos factos escandalosos escapam até ao olhar atento do vizinho mais atento...
Em “Neighbors” os residentes de um pequeno complexo de apartamentos vêem a sua existência pacata em perigo quando uma série de homicídios sucedem dentro da sua área de conforto. A mais recente vítima, Yeo-seon (Sae-ron Kim) vivia no seu prédio. A despeito do acontecimento trágico, eles até podiam esquecer o sucedido e prosseguir com a vida normal não fosse o comportamento muito suspeito do novo vizinho Seung-hyuk (Sung-kyun Kim). Quase todos têm alguma interacção estranha com Seung-hyuk e cedo se estabelece que ele deve ser o assassino da criança. Levanta-se pois uma nova questão, com o comportamento cada vez mais descuidado do assassino e com novas vítimas a surgir, quem será capaz de denunciar o vizinho?
“Neighbors” faz recordar um fenómeno que alguns terão estudado em psicologia ou com o qual se terão cruzado se gostam de canais como o “Biography” denominado de Efeito Genovese. Este é assim denominado, após o estudo por psicólogos de um caso que chocou a América nos anos 60, quando Catherine Genovese foi atacada e esfaqueada até à morte, durante meia hora, os seus gritos e ataque inicial testemunhados por cerca de duas dezenas de pessoas. Ninguém foi capaz de a acudir e o telefonema para a polícia também foi realizado tardiamente. Genovese viria a morrer no hospital. “Neighbors” apresenta também uma panóplia de personagens que, por diversas razões se desresponsabilização da decisão que poderá levar à captura do criminoso, transferindo o ónus para qualquer outro que não eles próprios. Decisão ainda mais premente quando a polícia não possui ainda qualquer pista substancial que o leve a uma prisão.
Kyung-hee (Yun-jin Kim) encontra-se à beira da loucura, tal é a culpa que sente por não ter ido buscar a enteada à escola. Nesse dia a criança desaparecia para o seu corpo ser depois encontrado mutilado, numa mala de viagem. Agora, Kyung-hee vê o fantasma da enteada chegar todos os dias a casa. Entretanto, Sang-yoon (Ji-han Do) verifica um padrão peculiar num dos residentes do condomínio. Ele faz uma entrega de pizza na mesma casa sempre que desaparece uma pessoa. Yong-nam Jang (Tae-Seon Ha) é uma mãe com pouco que fazer e passa o tempo todo a fazer planos para o condomínio, mesmo que isso implique envolver o novo vizinho esquisito e reticente. Aliás, ela encontra-se tão ocupada que descura a própria filha, ela que é uma fotocópia da menina que foi encontrada morta (interpretada pela mesma actriz Sae-ron Kim). Quanto a vós não sei mas se fosse minha filha estaria muito preocupada.
Sang-young (Ha-ryong Lim) é o dono de uma loja de malas de viagem da qual um homem misterioso se tornou cliente assíduo. Jong-rok (Ho-jin Cheon) é um dos seguranças do condomínio que pretende passar despercebido. No entanto, ele sente afinidade pela filha da vizinha da associação de condóminos e não vê com bons olhos o interesse que um dos novos vizinhos parece tomar por ela. Hyuk-Mo (Dong-sok Ma) é um gangster e um bruto impiedoso com quem se atravessa nos seus planos, mesmo que isso signifique apenas não saber estacionar um carro. Todos absorvidos pela sua realidade de tal modo que não vêem ou fingem não ver o que é óbvio. Naquele microcosmos, mesmo que se conheçam não se relacionam além do superficial. Nem o desejam. Que quanto menos souberem melhor. O instinto de auto-preservação é superior à solidariedade. A seu tempo, vão formando uma ideia da realidade e entram num estado de dissonância cognitiva. Será que vão agir? Mais, será que vão agir a tempo? Apesar de ser um elenco vasto, os personagens são facilmente identificáveis e o argumento é excelente a veicular as suas motivações. Não querem perder o trabalho, não querem que sejam descobertos os seus segredos, acham que não é o seu papel… A força do elenco perde-se no tempo que demora a interligar as estórias individuais. Também o casting de Sae-ron Kim nas duas personagens menores é duvidoso. A jovem é talentosa e compreende-se o objectivo da parecença da vítima e de um alvo potencial, por um lado o humor instável da mãe e, por outro, despoletar os instintos homicidas do criminoso, mas bastava apenas que fosse uma actriz fisicamente semelhante. Além disso, o fantasma surge em demasia. Se a ideia era enfatizar o assombro de Yoo-jin com a sua própria culpa a ideia foi apresentada e repetida por demais pois que chega um momento em que nos questionamos se é um fantasma das mentes dos culpados ou o espectro é real. Aspectos sobrenaturais à parte, “Neighbors” é um thriller à boa maneira coreana: leva o seu tempo mas é eficaz. Três estrelas.
O melhor:
- Elenco
- Narrativa fragmentada permite ter insight sobre o que se passa na cabeça de cada um dos personagens sem alienar
- Suspense
O Pior:
- Elemento sobrenatural. Quando é que os argumentistas coreanos vão aprender que não precisam de acrescer elementos de outros géneros se estória inicial tem qualidade por si só?
- Demasiado tempo para interligar as estórias individuais
Realização: Hwi Kim
Argumento: Hwi Kim e Pool Kang (banda-desenhada)
Yun-jin Kim como Kyung-hee
Sung-kyun Kim como Seung-hyuk
Ji-han Do como Sang-yoon
Tae-Seon Ha como Yong-nam Jang
Sae-ron Kim como Yeo-Seon/Sooyeon
Ha-ryong Lim como Sang-young
Ho-jin Cheon como Jong-rok
Dong-sok Ma como Hyuk-Mo
Próximo Filme: Jeritan Kuntilanak, 2009
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