Shinya Tsukamoto, realizador conhecido por ter alguns clássicos de culto no currículo incluído o incontornável filme do subgénero cyberpunk “Tetsuo” (1989) e a respetiva sequela, ou o drama erótico (experimental?! Diria que em qualquer filme de Tsukamoto a experiência é uma constante) “A Snake of June” (2002), retoma a sua abordagem pouco convencional num mistério detectivesco.
Em Tóquio, ocorrem num curto espaço de tempo, duas mortes brutais por esfaqueamento. Numa primeira análise, as condições em que sucederam, como o facto de os apartamentos onde foram encontrados os corpos se encontrarem fechados por dentro, fariam crer à força policial que esta estaria perante casos de suicídio. Um erro negligente e amador para Keiko Kirishima (Hitomi) uma inteligente mas inexperiente detective no terreno, que foi transferida há muito pouco tempo para aquela esquadra. A reprovação e desrespeito pela senioridade dos colegas em conjugação pela reacção de choque ao visionar os cenários macabros do crime, granjeiam-lhe a desconfiança dos colegas Ishida (Ren Osugi) e Wakamiya (Masanobu Ando) e a desvalorização das capacidades que o seu currículo ostenta. É a cabeça fria porém que lhe diz que existe algo mais por trás de mortes tão aparatosas. Os suicídios foram grotescos, por que não escolher formas mais rápidas e indolores de provocar a própria morte? Se a morte foi voluntária porque é que em ambos os casos há relatos de pedidos de ajuda ou de agonia não deliberada? Por fim, ambas as vítimas marcaram o número 0 antes da morte? Estarão perante um culto suicida ou porventura, um anjo da morte? Estas e outras interrogações levam a investigação policial por caminhos nunca trilhados no campo dos sonhos e que são a todo o momento questionados pelos detectives mais racionais. A investigação conduz Keiko a Kyoichi Kagenuma (Ryuhei Matsuda), um homem atormentado de quem se diz possuir a capacidade de mergulhar nos sonhos de terceiros. Entretanto e, a bem do velho método policial continua uma investigação paralela com diligências mais convencionais.
Se a premissa já parece intrigante o facto de ter o nome de Shinya Tsukamoto associado é a confirmação de que “Nightmare Detective” não é o thriller policial típico. É aliás, o ambiente natural para Tsukamoto se exibir em todo o seu esplendor. Ele é obsessivo no que respeita ao mundo onírico. Quase todos os seus filmes têm uma ou mais sequências de sonho e flashbacks.
As bizarrias, fetiches e pecados imaginários ou passados podem ser resgatados na psique dos personagens desta forma. Sem se tornarem repetitivas, as cenas são tão características do trabalho do realizador que por vezes, pode até aparentar que elas foram idealizadas em primeiro lugar na sua mente e só numa fase posterior se desenhou o remanescente da estória. Elas constituem ainda momentos surrealistas que em muito fazem lembrar realizadores como David Lynch. No caso de “Nightmare Detective” será porventura mais fácil descortinar o significado por trás da imagética pois que este, apesar de tão distintivo do realizador é uma versão mais acessível e comercial da sua filmografia. Ele próprio surge como uma personagem fulcral na narrativa, pois que ele gosta de imergir nos seus próprios filmes através da interpretação de personagens – sem qualquer vestígio de surpresa –, quanto mais bizarras melhor. A premissa de “Nightmare Detective” conduz a algumas semelhanças óbvias com “Nightmare in Elm Street” contudo, é bem mais difícil de rotular, encontrando-se mais próximo do thriller que do género de terror. É representativo do trabalho do realizador sem se tornar pretencioso e é uma lufada de ar fresco para os mistérios detectivescos em geral. Temos aqui um bom ponto de partida para um franchise de sucesso. Três estrelas.
Realização: Shin'ya Tsukamoto
Argumento: Hisakatsu Kuroki e Shin'ya Tsukamoto
Ryûhei Matsuda como Kyoichi Kagenuma
Hitomi como Keiko Kirishima
Masanobu Andô como Detective Wakamiya
Ren Ohsugi como Detective Sekiya
Yoshio Harada como Keizo Oishi
Próximo Filme: "Black Coal, Thin Ice" (Bai ri yan huo, 2014)
Sem comentários:
Enviar um comentário