O mundo precisava mesmo de uma sequela de “Suicide Club” (2001)? Quer queiram ou não, ela existe. Desta feita, Shion Sono apresenta um tom mais familiar, centrado na vida de Noriko Shimabara (Kazue Fukushi) uma adolescente sonhadora que ambiciona deixar uma existência banal. Ela vive com o pai Tetsuzo Shimabara (Ken Mitsuishi), a mãe Taeko (Sanae Miyata) e a irmã mais nova Yuko (Yuriko Yoshitaka), todos eles demasiado distraídos para compreender que Noriko é mais do que uma rapariga que deverá cumprir tudo quanto é esperado dela. Na verdade ela encontra-se profundamente deprimida com a possibilidade de nunca abandonar a pequena vila que habita e onde todos, sem excepção, levam vidas sem quaisquer vestígios do Extraordinário. É isso que ela quer, o Excepcional. Quer partir para Tóquio, grande cidade e onde os sonhos são tão grandes quanto a cidade, isto é, maiores do que a maioria. Ela está registada num site onde encontra outras adolescentes tão alienadas quanto ela e, num impulso planeado, foge de casa para se encontrar com “Estação de Ueno 54” ou Kumiko (Tsugumi) que a leva numa viagem pelo mais bizarro de Tóquio, uma “seita” especializada no aluguer de famílias para corações solitários e indivíduos que perderam alguém especial.
Qualquer obra de Sono tem uma sinopse interessante, desde o suicídio em massa de adolescentes a extensões de cabelo assassinas em série, a sua filmografia promete bastante. Quando escreve em parceria ou deixa mesmo a tarefa para outros (evento raro) as películas fluem bastante melhor. Porque o homem, por bem intencionado que seja, é incapaz de editar o seu próprio pensamento resultando, depois, em obras que sentimos serem bem mais longas do que a sua duração real. Bem, “Love Exposure” (2008) tem Quatro! horas de duração. Multipliquem por dois e ficam a duração real de tempo desperdiçado. “Noriko’s Dinner Table” segue essa regra implícita. Desbastando a película em 30 minutos, “Noriko’s Dinner Table” seria mais directa ao assunto, sem perturbar o pensamento de quem o escreveu. O maior problema de Sono é não se conseguir abster de microanalisar a mais pequena expressão facial ou pensamento. Ele diz-nos em que reparar e como processar essa mesma informação. Mais condescendente e com menor fé no espectador é difícil. Essa sensação é depois acentuada pela narração constante. A vida interior dos personagens já é, por isso só, um livro aberto. A necessidade de preencher um espaço vazio percepcionado pelo argumentista-realizador como narração desnecessária é tão-só um preciosismo num filme já pejado de significações. Juventude alienada, sobretudo num país onde os jovens são sobre-estimulados, onde a doença mental ainda é olhada de soslaio, o poder da internet na criação de mundos secretos para mentes inquietas e a sua capacidade de distorcer e criar universos preferíveis àqueles que de facto habitamos, a reflexão sobre o que é a identidade e como esta nos influencia, a possibilidade de romper com o passado e inventar uma nova pessoa… Todos estes temas são abordados por diversas personagens com perspectivas muito diferentes… A fugitiva, aquela que apoiou e até encorajou a fuga, o que procura desesperado aquela que perdeu… E em pano de fundo uma pergunta, repetida até à exaustão, lavagem cerebral, cortesia de Shion Sono: estás conectado a ti próprio? Ao fim de uma hora, se ainda não estivermos conectados com a seca que de facto estamos a apanhar, não, se calhar, não estamos.
“Noriko’s Dinner Table” funciona melhor quando estabelece uma ligação ao predecessor “Suicide Club”, satisfazendo muito do que ficou por explicitar neste último. Talvez por compensação Sono tenha transportado demasiado para este Noriko. A transmissão das suas reflexões mediante a apresentação da tragédia de uma família que, em última análise, não se conhece de todo, é capaz de aproximar mais as audiências. No entanto, quando esta for fim se volta a sentar ao redor de uma mesa, trocando sorrisos e passando comida uns aos outros, este cenário parece estranhamente artificial. Duas estrelas.
O melhor:
- O elenco
- Temas com os quais as sociedades modernas se podem identificar
O pior:
- Duração
- Infantilização do público
Realização: Shion Sono
Argumento: Shion Sono
Kazue Fukushi como Noriko Shimabara
Ken Mitsuishi como Tetsuzo Shimabara
Tsugumi como Kumiko
Sanae Miyata como Taeko
Yuriko Yoshitaka como Yuko
Próximo filme: "Howling", 2012
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